Haifa, outubro de 2020

A transformação da Santa Sofia numa mesquita certamente não é algo com caráter simbólico insignificante para o presidente turco Recep Tayyip Erdogan. Antes da conquista de Constantinopla pelos otomanos, em 1453, ela era a maior e mais importante igreja ortodoxa. Para os cristãos ortodoxos, Santa Sofia tinha um significado semelhante ao que a Basílica de São Pedro, no Vaticano, tem para os católicos. A transformação dessa majestosa igreja numa mesquita foi um acontecimento traumático para os cristãos ortodoxos; para os otomanos, um símbolo da vitória sobre os cristãos.

Tal era a situação até o ano de 1934 (após a Primeira Guerra Mundial), quando o império turco chegou a um final melancólico e, sob a presidência de Atatürk, foi remodelado num país secular. O imponente prédio histórico, originário da Era Bizantina, foi transformado num museu. Agora Erdogan pretende reverter a situação. Qual o significado disso?

Em sua página na internet, Erdogan explicou: “A ressurreição da Santa Sofia como mesquita é o prelúdio para a libertação da Al-Aqsa, em Jerusalém. Ela é o símbolo da vontade dos muçulmanos de todo o mundo para reacender o fogo da esperança de todos os muçulmanos e de todos os rebaixados, oprimidos e explorados”. Essa declaração merece nossa atenção.[1]

Em sua mensagem, Erdogan não fala em liberdade apenas para a mesquita de Al-Aqsa, em Jerusalém, mas também, dependendo do idioma para o qual é traduzida, fala de um reavivamento do islamismo, desde Bucara, no Uzbequistão, até Andaluzia, na Espanha.

A interligação de Santa Sofia com Al-Aqsa, em Jerusalém, mostra que as ambições de Ancara (capital turca) vão muito além de Santa Sofia.

Israel vê com preocupação os desenvolvimentos na Turquia. Havia a expectativa da reativação das relações com a nação, que outrora eram muito boas. Agora, porém, Israel reconheceu que isso não será mais possível. Em Israel, até então evitava-se entrar em confronto com os turcos, porque o relacionamento comercial ainda é amplo e importante para ambos.

As descobertas israelenses de gás no mar Mediterrâneo e o gasoduto planejado através do Mediterrâneo para a Europa não agradaram os turcos. A Turquia começou com perfurações próprias nas disputadas águas do Mediterrâneo e pretende ampliar o seu domínio nesse mar. A sua participação na guerra civil do Líbano é mais uma tentativa de ampliar sua influência naquela região.

Israel sempre considerava o Irã como a grande ameaça, e isso com razão, porque há muitos anos o Irã fala abertamente na destruição do Estado judeu. Porém, enquanto isso houve um descuido em relação à Turquia. Mesmo que, no passado, Turquia e Irã eram de certa forma antagônicos, eles se aproximaram pelos objetivos e pela ideologia em comum. Essa alteração deve ser de extremo alerta e preocupação para Israel.

Um motivo de preocupação adicional para Israel é o fato de que, até agora, os EUA não se mostram inclinados a reconhecer essa ameaça feita pela Turquia. A política do presidente Trump é a de procurar não se envolver em conflitos que não se refiram diretamente à América e de trazer suas tropas de volta ao seu país. É uma política até compreensível, mas que pode tornar-se cara para Israel. Nessa situação, a afirmação bíblica de que “o protetor de Israel não dormirá; ele está sempre alerta!” (Sl 121.4) serve de forte consolo.

Com essa esperança, vos saúda cordialmente de Israel com Shalom, vosso

Fredi Winkler

Nota

  1. Seth J. Frantzman, “Turkey vows to ‘liberate Al-Aqsa’ after turning Hagia Sophia to mosque”, The Jerusalem Post, 11 jul. 2020. Disponível em: <https://www.jpost.com/middle-east/turkey-vows-to-liberate-al-aqsa-after-turning-hagia-sophia-to-mosque-634700>.

 

Fredi Winkler é guia turístico em Israel e dirige, junto com a esposa, o Hotel Beth-Shalom, em Haifa, que é vinculado à missão da Chamada.

sumário Revista Chamada Outubro 2020

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