Daniel 12.9-13: A explicação final do anjo

Recado do Editor Sebastian Steiger

O livro de Daniel produz algumas das histórias mais conhecidas da Bíblia, narradas regularmente nas programações infantis das igrejas. Ao mesmo tempo, ele produz alguns dos capítulos menos mencionados e discutidos nos púlpitos das igrejas. Daniel recebeu e relatou visões proféticas abrangentes. Como entendê-las? Esse é o propósito do comentário de Daniel escrito por John F. Walvoord, um dos maiores teólogos do século passado.

Em resposta ao seu questionamento, Daniel ouviu mais uma vez que a revelação dada a ele era oficial e imutável e que ela permaneceria assim até o tempo do fim. O propósito primário da revelação era informar aqueles que viveriam naquele período. A interpretação confirmatória da história e do cumprimento da profecia seria necessária antes que as profecias finais pudessem ser compreendidas.

No entanto, em uma resposta parcial à pergunta de Daniel – “Meu senhor, qual será o fim destas coisas?” (v. 8) –, ele foi informado que o tempo do fim resultaria tanto na purificação dos santos quanto na manifestação do mal no coração humano. Da mesma forma, a compreensão dos eventos do tempo do fim será possível para “os sábios”, mas “os ímpios continuarão na sua impiedade, e nenhum deles entenderá”. A compreensão da profecia exige especialmente discernimento espiritual e o ensino do Espírito Santo. Ainda que as Escrituras descrevam em detalhes o tempo do fim, é óbvio que os ímpios não se valerão dessa revelação divina. Mas ela será uma fonte de consolo e direção para os que creem genuinamente em Deus. A revelação divina é, com frequência, dada para ocultar o seu significado dos não regenerados, ainda que seja compreensível para aqueles que são orientados espiritualmente.

Nos versículos 11 e 12, dois importantes detalhes são fornecidos para ajudar no esclarecimento acerca da duração do tempo do fim. Um período de 1 290 dias decorrerá desde o tempo em que o sacrifício diário for removido até a consumação do tempo do fim. O tempo no qual o sacrifício diário será retirado é associado com o estabelecimento da “abominação desoladora”. Essa expressão, citada originariamente em Daniel 9.27, refere-se à interrupção dos sacrifícios na metade do período de sete anos. O evento profetizado teve uma antecipação correspondente na desolação do templo perpetrada por Antíoco IV Epifânio, no século II a.C. (Dn 8.11-14). O fato de esse evento ser ainda futuro, não a profanação de Antíoco, fica claro com a profecia de Cristo em Mateus 24.15, onde “o abominável da desolação de que falou o profeta Daniel” é dado como um sinal da grande tribulação. Com base nessas passagens, torna-se evidente que os últimos três anos e meio do tempo do fim estão em vista.

O período “tempo, tempos e metade de um tempo”, de Daniel 7.25, é normalmente considerado como três anos e meio, ou quarenta e dois meses de trinta dias cada, de acordo com o costume dos judeus. Isso somaria apenas 1 260 dias. A duração da grande tribulação como 42 meses é confirmada por Apocalipse 11.2 e 13.5, que são considerados equivalentes a “um tempo, tempos e metade de um tempo” de Daniel 7.25 e 12.7. Por que, então, trinta dias foram acrescidos aos 1 260 dias? A contagem desses dias deve iniciar quando “o sacrifício diário for tirado e a abominação desoladora for estabelecida”. Se esse é o ponto que marca o início do período, talvez o ponto final seja a futura purificação e nova dedicação da área do templo e a retomada dos sacrifícios, que ocorrerão no começo do reino milenar (cf. Ez 43.18).1

A complexidade da questão quanto ao significado do número de dias é ampliada pelo versículo 12, pois ele especifica que haverá uma bênção especial para o “que espera e chega até mil trezentos e trinta e cinco dias”. Esse é mais um período adicional, de quarenta e cinco dias além do limite do versículo 11.

Embora Daniel não explique essa duração, é óbvio que a segunda vinda de Cristo e o estabelecimento de seu reino milenar demandam tempo. O período de 1 260 dias – ou, precisamente, 42 meses de trinta dias cada – pode ser considerado como culminando no segundo advento em si. Esse evento é seguido por inúmeros julgamentos divinos, como o julgamento das nações (Mt 25.31-46), e a reunião e o julgamento de Israel (Ez 20.34-38). Esses grandes julgamentos, iniciando com os que estiverem vivos na terra e o expurgo dos descrentes que adoraram a besta, embora realizados rapidamente, demandarão tempo. Ao término dos 1 335 dias, ou 75 dias após o segundo advento, esses grandes julgamentos terão sido concluídos e o reino milenar, formalmente iniciado. Aqueles que alcançarem esse período serão obviamente os que foram julgados dignos de entrar no reino, pois eles são chamados de “bem-aventurado[s]”.

Seja como for, não há justificativa para a tentativa de relacionar esse período com Antíoco IV Epifânio. Mesmo Zöckler admite: “Os conturbados eventos do período dos macabeus, que podem merecer atenção como os pontos do começo e do fim do equivalente histórico dos três anos e meio, não apresentam uma razão satisfatória para tais previsões vacilantes; pois o exato período requerido não pode ser encontrado naquela época, embora seus limites possam ser fixados”.2 Aqui, como em todo o livro de Daniel, a expressão “o tempo do fim” significa o fim do poder dos gentios, que se estende além da presente era, até o segundo advento, conforme antecipado na profecia de Cristo (Mt 24.15-31). Toda a abordagem da erudição liberal tentando tratar Daniel como história, não profecia, desmorona quando a natureza abrangente da revelação profética em Daniel é compreendida. A explicação do tempo adicional requerido para completar a transição do tempo do fim para o período do quinto reino sem dúvida não foi de grande ajuda a Daniel. Mas, à luz da revelação do Novo Testamento, ela fornece o pano de fundo para a transição da grande tribulação para o reino de paz e justiça na terra.

Antecipando que Daniel não compreenderia totalmente essas revelações, o anjo lhe diz: “Quanto a você, siga o seu caminho até o fim”. O anjo predisse que Daniel iria “descansa[r]”, isto é, morrer, mas que “ao fim dos dias” ele se levantaria “para receber a sua herança”. Essa foi a predição de que Daniel seria ressuscitado (12.2) e que participaria do glorioso triunfo de Cristo, quando o reino milenar for inaugurado. Uma vez que é dito que os santos ressurretos irão reinar com Cristo (p. ex., Ap 5.10), é concebível que Daniel, que governou durante o reinado de Nabucodonosor e de Dario, o medo, também receba uma futura responsabilidade executiva no reino terrestre de Cristo, para a qual a sua experiência terrena foi uma preparação.

Essa revelação final da profecia de Daniel, agindo como a última pedra sobre todas as tremendas revelações anteriores, estabelece o livro de Daniel como a maior e mais abrangente revelação profética do Antigo Testamento. A sua contrapartida no Novo Testamento, o livro de Apocalipse, fornece a palavra final de Deus com respeito ao programa profético das eras. Considerando as condições atuais do mundo, que parecem antecipar o cumprimento do tempo do fim de Daniel, é possível compreender Daniel hoje como nunca antes na história. A hora pode não estar muito distante, quando os santos fiéis da tribulação voltarão os olhos para essas páginas da Escritura e encontrarão nelas a força e a coragem para permanecerem fiéis, mesmo que isso signifique experimentar a morte de um mártir.

Para os cristãos que vivem na era da graça e buscam uma compreensão desses dias tão difíceis, os quais podem estar encerrando o propósito de Deus para a sua igreja, o livro de Daniel lança uma luz brilhante sobre os eventos contemporâneos que prenunciam a consumação. Se Deus está restaurando politicamente o seu povo, Israel, permitindo que a igreja afunde em indiferença e apostasia, bem como permitindo às nações se moverem em direção a uma centralização do poder político, pode não demorar muito para que o tempo do fim venha sobre o mundo. Muitos que aguardam a vinda do Senhor antecipam a sua remoção do cenário terrestre antes que se cumpram os derradeiros dias do tempo dos gentios.

Quando o plano de Deus completar todo o seu curso, será evidente, então, com muito mais clareza do que hoje, que Deus não permitiu que nenhuma palavra deixasse de se cumprir. Como Cristo afirmou: “Porque em verdade lhes digo: até que o céu e a terra passem, nem um i ou um til jamais passará da Lei, até que tudo se cumpra” (Mt 5.18).

Notas

  1. Para um paralelo histórico do período macabeu, veja 1Macabeus 4.37-39.
  2. Zöckler, “The Book of the Prophet Daniel”, 13:267.
Daniel

John F. Walvoord (1910-2002) foi um teólogo, pastor e presidente do Dallas Theological Seminary. Autor de mais de 30 livros, concentrou-se principalmente nas áreas de teologia e escatologia.

sumário Revista Chamada Julho 2023

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