Nada inteiro, nem pela metade
Há pouco mais de 75 anos, o plano de partilha da ONU para a Palestina pretendia promover a paz entre árabes e judeus. Até hoje os pré-requisitos para isso não se cumpriram.
Em 29 de novembro de 1947, chegou-se ao ponto: os judeus na Palestina acompanhavam febrilmente pelo rádio a votação do plano de partilha na ONU. Em fevereiro, os britânicos haviam repassado seu mandato da Palestina para as Nações Unidas. Uma comissão recomendou então à Assembleia Geral o plano de partilha como solução do conflito entre judeus e árabes. Por fim, 33 países votaram a favor da Resolução 181, e 13 votaram contra. Dez países se abstiveram, dentre os quais a Grã-Bretanha. Com isso, decidiu-se constituir um Estado judeu e outro árabe a oeste do Jordão, e Jerusalém ficaria sujeita a supervisão internacional.
A maioria dos judeus se alegrou com a decisão, mas nem todos estavam felizes. Revisionistas como Menachem Begin (1913-1992) sonhavam com um Estado do Nilo até o Eufrates, mas a corrente maior do movimento sionista aceitou o plano – por pragmatismo. Todos sabiam que ele teria pouca serventia: as fronteiras eram indefensáveis, e no Estado judeu os judeus tinham maioria apertada.
Conforme constata o historiador israelense Tem Segev, os árabes cometeram um erro tático com sua rejeição: eles não estavam preparados para uma previsível guerra e, com a aceitação do plano, poderiam ter obtido tempo. Mesmo assim, foram eles que declararam guerra ao Estado de Israel, fundado poucos meses depois. Em seu decorrer, eles perderam partes da região que lhes fora designada, dentre as quais a cidade desértica de Berseba.
Já dez anos antes, os árabes haviam assumido uma atitude de rejeição com consequências semelhantes: em 1937, a comissão britânica Peel também propusera uma partilha. Nela, a área prevista para os judeus tinha só metade da versão da ONU em 1947.
Os britânicos já haviam feito uma partilha em 1922. Naquela ocasião, a parcela a leste do Jordão, 77% da área do mandato, na qual os britânicos deveriam criam um “lar” para os judeus, foi atribuída a Abdullah Bin Hussein. A intenção era premiar a fidelidade da sua família, os hachemitas, ao Império. Hoje essa área é conhecida como Jordânia.
Um plano entre outros
Até o fim estava incerto se a Assembleia Geral das Nações Unidas concordaria com o mais recente plano de partilha, e também a ideia da divisão de modo nenhum estava gravada em pedra. Havia várias sugestões, e ainda em 1936 os britânicos consideravam a possibilidade de dividir o país segundo o modelo suíço em cantões, que depois seriam reunidos numa federação. Também o líder sionista e posterior presidente nacional Chaim Weizmann (1874-1952) considerou o mais tardar desde 1919 e até a década de 1930 uma “cantonização” como possibilidade de realizar a meta sionista.
Departamento cartográfico do exército israelense. O plano de partilha britânico (à esquerda) previa para os judeus uma área bem menor (em azul) que o plano de partilha da ONU em 1947.
Todavia, os britânicos perceberam logo que essa solução não seria praticável, em boa parte por causa das grandes demandas organizacionais. Assim, então, uma partilha passou a ser novamente mais visada, embora a Comissão Peel, encarregada do processo, soubesse que sua proposta não constituía uma solução ideal. Ela enfatizou que aquilo seria apenas um passo radical e terminal. Para descrevê-lo, ela recorreu a um conceito médico: seria uma intervenção cirúrgica no paciente enfermo, a Palestina.
Na opinião dos britânicos, a Palestina estava “doente”, porque desde o massacre de 1929 a violência fazia parte da vida diária: árabes contra britânicos, árabes contra judeus, em algum momento judeus contra britânicos – e as ligas combatentes judias ainda faziam valer suas rivalidades. Diante dessa situação, os britânicos se cansaram do seu mandato. Principalmente depois da violenta rebelião árabe de 1936 a 39, eles ansiavam pela despedida, que acabou postergada pela Segunda Guerra Mundial, para então se efetivar em 1948.
Conflito pendente
Hoje, pouco mais de 75 anos após o plano de partilha, ainda não está resolvida a questão de como árabes e judeus poderiam conviver permanentemente, sem violência. No Ocidente, em particular, uma “solução de dois estados”, na qual entrementes se inclui um estado “palestino”, é tida como chique. Também o ex-chefe do governo israelense, Yair Lapid, em setembro do ano passado, pronunciou-se a favor no palco da assembleia geral da ONU, contudo, ele estabeleceu para isso a condição de que um estado palestino fosse “pacífico” – sem dizer em que medida ele considera isso realista. De qualquer forma, em seu discurso ele se queixou de que, depois da retirada israelense da Faixa de Gaza, os palestinos teriam tido mais interesse em disparar mísseis contra Israel do que em desenvolver sua própria economia.
“Hoje, pouco mais de 75 anos após o plano de partilha, ainda não está resolvida a questão de como árabes e judeus poderiam conviver permanentemente, sem violência.”
Nas condições atuais, a alternativa da “solução de estado único” também não parece praticável. A especialista em direito e segurança Pnina Scharvit Baruch ensaiou, em dezembro de 2021, quatro variantes desse modelo: federação, confederação, um estado com autonomia palestina e um estado sem ela. Nenhuma dessas variantes lhe pareceu viável. Segundo ela, um dos principais motivos para isso é a livre mobilidade ligada a tal estado, que dificultaria maciçamente a inibição de atos violentos. Com todas as desvantagens, ela considera uma separação dos palestinos, ou seja, uma “solução de dois estados”, como sendo mais útil.
Seja qual for a solução que se defenda: diante da história do plano de partilha e de suas tentativas de solução, o clamor por uma “solução de dois estados” sem consideração das correspondentes premissas parece ser excessivamente grosseiro. Segundo estatísticas atualizadas, na região a oeste do Jordão o número de judeus e árabes é aproximadamente o mesmo. Os pacíficos entre eles merecem abordagens mais inteligentes do que a constante repetição desta fórmula.