A Carta aos Romanos: Capítulo X

Há uma história a respeito de um cético ateu, do qual um amigo zombou porque ele ia todos os domingos à igreja para ouvir um pastor. Em resposta, o cético observou: “Não creio em nada do que ele diz, mas ele crê, e uma vez por semana quero ouvir alguém que crê naquilo que diz!”.[1]

O apóstolo Paulo, autor da carta aos Romanos, estava profundamente impregnado da verdade do evangelho. Essa verdade marcou toda a sua vida e determinou seu ministério. Com a mais profunda convicção, ele disse: “Pois não me envergonho do evangelho, porque é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê...” (Rm 1.16).

Paulo sabia que esse evangelho incorpora um imenso poder: o poder do perdão, da reconciliação, da renovação e da salvação. A respeito desse poder, Paulo diz: “Certamente a palavra da cruz é loucura para os que se perdem, mas para nós, que somos salvos, ela é poder de Deus” (1Co 1.18).

Paulo sabia que, graças a esse evangelho, ninguém precisaria se perder. Todo o que quiser pode ser salvo. Ninguém precisa servir ao pecado. Todo o que quiser tem acesso ao céu, já que o evangelho é a mensagem “para a salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu e também do grego” (Rm 1.16).

O grande objetivo de Deus (v. 1-11).

Com esse objetivo em vista, Paulo volta a expor seus pensamentos, desejos e palavras: “Irmãos, o desejo do meu coração e a minha súplica a Deus em favor deles é para que sejam salvos” (Rm 10.1).

Esse objetivo de Deus nunca mudou. Desde a queda no pecado, Deus deseja a salvação do ser humano – bem como a sua e a minha redenção. Esse objetivo já brilha para nós desde o Antigo Testamento, como diz o profeta Ezequiel: “Tão certo como eu vivo, diz o Senhor Deus, não tenho prazer na morte do ímpio, mas em que o ímpio se converta do seu caminho e viva. Convertam-se! Convertam-se dos seus maus caminhos! Por que vocês haveriam de morrer, ó casa de Israel?” (Ez 33.11).

Paulo confirma que Deus “deseja que todos sejam salvos e cheguem ao pleno conhecimento da verdade” (1Tm 2.4). Essa vontade de Deus é o ministério que Israel teria de atender. Israel deveria ser uma luz e uma bênção para as nações. Deveria aguardar e receber o Messias e, finalmente, revelar sua salvação, a salvação de Deus. Esse foi o ministério atribuído ao povo de Israel.

Infelizmente, Israel não atendeu a esse ministério: como povo, ele errou o alvo que lhe fora proposto. Errar por pouco também é errar completamente. Quem quer que já tenha dado um tiro de fuzil sabe que, mesmo com a melhor arma, é possível errar o alvo. Mesmo o melhor atirador nem sempre acerta o alvo. Os motivos para isso podem ser: errar de propósito, não considerar a distância ou a direção do vento, ou simplesmente o dispositivo de mira estar desregulado.

Sobre esse alvo, Paulo diz que “o fim da lei é Cristo, para justiça de todo aquele que crê” (Rm 10.4).

O Messias deveria tornar-se conhecido por meio de Israel, que deveria anunciar Jesus Cristo. Todo o Antigo Testamento persegue o objetivo de revelar Jesus Cristo, o Messias de Israel. Tudo o que encontramos ali – o simbolismo no tabernáculo, os sacrifícios no templo, o culto levítico, o reinado, os profetas, os sacerdotes – são imagens e referências a Jesus. Por isso cabe insistir mais uma vez no que Paulo diz: “Porque o fim da lei é Cristo, para justiça de todo aquele que crê” (Rm 10.4).

Por que Israel fracassou?

A pergunta não quer calar: por que Israel fracassou, tendo em vista que Paulo pôde testificar a respeito dos judeus que “[eles] têm zelo por Deus” (Rm 10.2)?

A história do povo judeu é uma luta constante pela justiça diante de Deus. Tenta-se minuciosamente cumprir as regras, instruções e leis. Os judeus piedosos eram capazes de desprezar sua própria vida quando se tratava de morrer por sua fé. Junto ao Muro das Lamentações em Jerusalém nos comovemos com seu zelo por Deus. A qualquer hora do dia ou da noite pode-se encontrar ali gente orando e derramando seu coração diante de Deus.

Todavia, Paulo precisa dizer a respeito desses sinceros esforços: “Porque dou testemunho a favor deles de que têm zelo por Deus, porém não com entendimento. Desconhecendo a justiça de Deus e procurando estabelecer a sua própria justiça, não se sujeitaram à justiça que vem de Deus” (Rm 10.2-3).

Seu zelo, seu esforço e seu empenho passam ao largo do ponto que decide tudo, do alvo que Paulo define: “Porque o fim da lei é Cristo, para justiça de todo aquele que crê” (Rm 10.4).

Trata-se de Cristo! A Bíblia diz claramente que Deus não deseja nosso esforço próprio. Pelo contrário, Deus quer simplesmente que venhamos a Jesus Cristo, que nos lancemos em seus braços abertos e que digamos “sim” ao Messias de Israel.

O mais difícil de tudo

Parece que o mais difícil para nós é nos achegarmos a Jesus sem contribuição nossa, sem esforço próprio, simplesmente lançando-nos em seus braços. Paulo sabe disso por sua própria e sofrida experiência, porque de algum modo ainda queremos merecer o céu, o que é impossível: “Ora, Moisés descreve assim a justiça que procede da lei: ‘Aquele que observar os seus preceitos, por eles viverá’” (Rm 10.5).

É nisso que reside o fracasso de Israel e o nosso também, porque o céu só se abre ao crente, tal como Paulo escreve: “Mas a justiça que procede da fé afirma o seguinte: ‘Não pergunte em seu coração: Quem subirá ao céu?’, isto é, para trazer Cristo lá do alto; ou: ‘Quem descerá ao abismo?’, isto é, para levantar Cristo dentre os mortos. Porém, o que se diz? ‘A palavra está perto de você, na sua boca e no seu coração’, isto é, a palavra da fé que pregamos” (Rm 10.6-8)

Em outras palavras: não se esforce para ser guardado do inferno. Não se esforce em atingir o céu. Creia e confie naquilo que Jesus Cristo fez por você na cruz do Calvário.

Podemos ver isso ilustrado na história a seguir.

Durante uma simulação de avalanches, dois jovens foram enterrados na neve. Era um exercício para localização de soterrados. No momento em que os dois estavam dentro do seu fosso, desabou uma avalanche real. Muitas horas depois, um deles pôde ainda ser resgatado com vida.

Todos os encarregados ali se perguntaram como foi possível que, em tal situação, alguém sobrevivesse por tanto tempo. O outro estava morto. Constatou-se que ele havia tentado salvar a si mesmo. O primeiro, por seu lado, considerou: se eu tentar me salvar, vou consumir minhas forças e o oxigênio disponível. Minha única esperança agora é confiar em que outros venham me salvar. Qualquer movimento que eu fizer será excessivo. Se eu quiser ser salvo, preciso ficar bem quieto. Ele tinha a certeza de que lá fora estava uma equipe de salvamento que tentava por todos os meios salvá-lo. Essa certeza lhe ajudou a não tentar uma loucura tentando salvar a si mesmo.

“É impossível nos justificarmos por conta própria perante Deus e entrar no céu. Israel fracassou diante dessa impossibilidade, assim como ainda hoje muitos fracassam.”

Para os soterrados na avalanche era impossível salvarem-se a si mesmos. Do mesmo modo, é impossível nos justificarmos por conta própria perante Deus e entrar no céu. Israel fracassou diante dessa impossibilidade, assim como ainda hoje muitos fracassam. Todos nós estamos soterrados, presos no cárcere do pecado e imobilizados. No entanto, com qual dos dois soterrados nos identificamos? Queremos libertar a nós mesmos e romper nós mesmos os muros da prisão, para assim perecer miseravelmente?

Crer e confiar são a mesma coisa. Paulo diz sobre isso: “Mas a justiça que procede da fé afirma...” (Rm 10.6). Confio em que a ajuda virá de fora, que Deus fez e fará tudo para salvar a mim também. E assim aquele que é salvo diz: “‘A palavra está perto de você, na sua boca e no seu coração’, isto é, a palavra da fé que pregamos” (Rm 10.8b).

Trata-se da confissão de que preciso de ajuda, que só Deus pode me ajudar, a consciência de que somente em Jesus Cristo há salvação para mim.

A grande missão (v. 12-21)

Paulo mostra-nos a chave. É a chave da redenção, a boa nova, o evangelho. É a mensagem de que o caminho de Deus traz salvação. A salvação vem por meio da equipe de resgate, é iniciativa dele. E sua iniciativa é a cruz do Calvário, é seu Filho Jesus Cristo, que, ao morrer ali e ressuscitar, nos traz salvação.

Portanto, requer-se a nossa decisão, porque da minha decisão é que depende a vida ou a perdição eterna. Minha decisão diante do evangelho de Deus é que determinará onde passarei a eternidade.

Paulo expôs na carta aos Romanos todo o evangelho e agora diz de forma bem pessoal: “Se com a boca você confessar Jesus como Senhor e em seu coração crer que Deus o ressuscitou dentre os mortos, você será salvo. Porque com o coração se crê para a justiça e com a boca se confessa para a salvação. Pois a Escritura diz: ‘Todo aquele que nele crê não será envergonhado’” (Rm 10.9-11).

Você consegue confessar isso? Jesus é o seu Salvador e Senhor, seu Redentor? Que alegria quando alguém confia sua vida a Jesus, podendo dizer, baseado no evangelho: “Entreguei minha vida a Jesus! Minha culpa foi perdoada. Sou um filho de Deus. Jesus habita em mim”.

É maravilhosa e gloriosa a esperança de tal pessoa: “Pois a Escritura diz: ‘Todo aquele que nele crê não será envergonhado’” (Rm 10.11).

Paulo propôs uma grande questão: “Como, porém, invocarão aquele em quem não creram? E como crerão naquele de quem nada ouviram? E como ouvirão, se não há quem pregue?” (Rm 10.14).

Como igreja de Jesus, temos uma grande tarefa, de alcance mundial. Somos chamados a cumprir uma missão junto a todos os povos e línguas, à qual ninguém, realmente ninguém que se considere cristão, pode se furtar: transmitir o evangelho, a boa nova de Jesus Cristo. Pergunta-se então: o que eu faço pessoalmente para atender a essa ordem de Jesus Cristo? A ordem é: “Vão por todo o mundo e preguem o evangelho a toda criatura” (Mc 16.15)!

“Essa mensagem, esse evangelho, foi confiado a nós, igreja de Jesus. O que fazemos na prática para que essa mensagem seja levada a todo o mundo?”

Da parte de Deus, tudo já foi feito para nos redimir. Em Jesus Cristo, Deus se tornou homem, deixou-se pregar na cruz em nosso lugar e tomou sobre si toda a nossa culpa e nosso pecado. Ele nos reconciliou com o Pai celeste e desimpediu o caminho de retorno à casa paterna de Deus. Essa mensagem, esse evangelho, foi confiado a nós, igreja de Jesus. O que fazemos na prática para que essa mensagem seja levada a todo o mundo?

Uma séria advertência

“Pergunto mais: será que isso não chegou ao conhecimento de Israel? Moisés já dizia: ‘Eu farei com que vocês fiquem com ciúmes de um povo que não é nação; por meio de gente insensata eu os provocarei à ira’. E Isaías é tão ousado que diz: ‘Fui achado pelos que não me procuravam, revelei-me aos que não perguntavam por mim’. Quanto a Israel, porém, diz: ‘Todo dia estendi as mãos a um povo desobediente e rebelde’” (Rm 10.19-21).

Que tragédia e que declaração sobre Israel, o primeiro amor de Deus. Todavia, não corremos nós o mesmo risco como igreja de Jesus? Não fazemos muitas vezes o mesmo que Israel fez? Esquecemos o nosso chamado e nossa missão!

Por isso, Paulo quer motivar-nos a tomar posição pelo evangelho: “Pois não me envergonho do evangelho, porque é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu e também do grego” (Rm 1.16).

Nota

  1. Essa citação é por vezes atribuída a David Hume, mas é de autoria desconhecida. (N. E.)

Samuel Rindlisbacher é ancião da igreja da Chamada na Suíça e foi fundamental no desenvolvimento do grande ministério de jovens dela.

sumário Revista Chamada Janeiro 2023

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