Curiosidades históricas sobre o Natal
A Bíblia relata muitas informações com relação ao período do nascimento do Messias. Neste artigo, Norbert Lieth esclarece os diversos acontecimentos e relatos desse período.
A genealogia de Jesus
Mateus dirigiu o seu evangelho a judeus. Ele inicia o relato sobre a vida de Jesus com uma genealogia a fim de comprovar que Jesus descendia de Davi e Abraão. Com essa exposição, Mateus prova que Jesus é judeu e o Messias de Israel, assim como os profetas previram.
Essa genealogia de Jesus contém 46 nomes que viveram ao longo de um período de aproximadamente 2 000 anos. Isso corresponde a uma média de idade pouco superior a 43 anos. São personagens bastante variados, os que Mateus relaciona ali: há heróis da fé como Abraão, mulheres de passado duvidoso, gente absolutamente comum sobre quem não se sabe muito e pessoas extremamente malignas, como Manassés e Abias. Deus não permitiu que a trajetória do seu plano de salvação fosse limitada por fracassos humanos. Afinal, o Redentor viria a favor de pecadores.
“Deus não permitiu que a trajetória do seu plano de salvação fosse limitada por fracassos humanos.”
Nessa genealogia, José não é citado como pai de Jesus, mas apenas como esposo de Maria (Mt 1.16; cf. Lc 3.23). Trata-se de uma clara indicação de que Jesus nasceu de uma virgem como Filho de Deus. Por um lado, por meio do nascimento virginal (Mt 1.18,23; Lc 1.27) o Senhor Jesus foi totalmente humano, mas por outro – ao não ter sido gerado por um homem terreno – era isento da natureza pecaminosa hereditária por essa via. Como ele não foi concebido nem nasceu em pecado e também nunca pecou, ele pôde redimir o mundo ao assumir na cruz todo o pecado.
Mateus registra os dados sobre o nascimento de Jesus a partir de Abraão, enquanto Lucas levanta a genealogia até Adão. A razão disso é que Mateus se dirige a judeus para lhes mostrar que Jesus é o Messias prometido. Lucas dirige-se a não judeus e com isso enfatiza que Jesus é o Redentor de todos os homens. Mateus era judeu puro, enquanto Lucas tinha um nome grego. Segundo alguns pais da igreja, Lucas era natural de Antioquia na Síria e não era judeu. Se for de fato assim, Deus lançou mão de um judeu e de um gentio para descrever a vinda do Redentor para judeus e gentios.
Tanto José como Maria eram descendentes diretos do rei judeu Davi (Mt 1.16,20; Lc 1.27; 3.31). Com isso, o Senhor era um legítimo descendente de Davi e herdeiro do trono tanto do ponto de vista jurídico (via José) como também físico (via Maria), o que possibilitou o cumprimento das promessas dadas a Davi sobre os seus descendentes (2Sm 7.16; 1Cr 17.11-14).
José e Maria
O casamento judeu consistia em três estágios: o primeiro era o acordo entre as duas famílias. Em seguida, vinha o anúncio público do noivado. Durante esse período, o casal ainda não vivia junto e o relacionamento matrimonial era proibido. Como, porém, o noivado já era considerado um compromisso, sua dissolução só poderia ser realizada por meio de um divórcio legal. Só no terceiro estágio é que o casal se casava e passava a morar junto. Quando José constatou a gravidez de Maria, ele quis dissolver o noivado, mas de forma a não expor Maria publicamente (Mt 1.18-19). Contudo, por meio de uma revelação divina que lhe comunicou que a gravidez de Maria era sobrenatural (ou seja, resultante de um milagre de Deus), José se casou com Maria, mas abriu mão do relacionamento sexual até que Jesus nascesse (Mt 1.20-25).
O filho deveria receber o nome de Jesus. Esse nome – Yeshua (Josué) em hebraico – significa “Jeová é salvação”: “Ela dará à luz um filho e você porá nele o nome de Jesus, porque ele salvará o seu povo dos pecados deles” (Mt 1.21).
O imperador Augusto
O imperador Augusto era sobrinho-neto de César e governou de 30 a.C. a 14 d.C. Augusto é também conhecido pelo nome de Gaio Otávio, mas o senado conferiu-lhe o nome Augusto como título honorífico. Seu significado é “o excelso”. Assim, o Senhor Jesus foi a resposta de Deus ao excelso entre os homens, porque daí em diante Jesus Cristo seria o Senhor de todos os senhores e Rei sobre todos os reis: ele é o Excelso de Deus.
Herodes
Herodes era idumeu (ou edomita), e provavelmente não era um judeu autêntico, razão pela qual sua aceitação pelos judeus era precária. Nisso, os judeus piedosos, principalmente, reportavam-se a Deuteronômio 17.15: “Vocês certamente porão como rei sobre vocês aquele que o Senhor, seu Deus, escolher. Homem estranho, que não seja do meio dos seus compatriotas, vocês não devem pôr como rei sobre vocês, e sim um do meio dos seus compatriotas”. Herodes foi instituído na Judeia como rei vassalo de Roma e recebeu o título de “rei dos judeus”. Ele governou de 37 a 4 a.C. Para muitos judeus, Herodes era um usurpador que havia assumido o domínio ilegalmente. Herodes tornou-se muito conhecido por sua enorme atividade construtora, principalmente pela completa renovação e remodelação do templo em Jerusalém. Além disso, adquiriu fama cruel pelo massacre dos meninos em Belém.
Os magos do Oriente e a estrela de Belém
Os magos do Oriente (região da Babilônia) são também chamados de astrólogos, mas não de reis. Não se sabe quantos eram. O número de três deriva dos três presentes que entregaram a Jesus, mas mesmo cinquenta pessoas podem ter entregado esses três preciosos presentes.
A estrela é também chamada de “sua estrela”. Os magos disseram: “... Porque vimos a sua estrela...” (Mt 2.2). As especulações sobre uma constelação particular de astros ou planetas não se aplicam. Antes, no caso dessa estrela, tratou-se de um fenômeno extraordinário por um milagre especial que anunciou o nascimento do Senhor. Não teria Deus, que criou o céu, criado um astro especial para anunciar o nascimento do seu Filho?
Impõe-se a pergunta de como os magos sabiam que nasceria um rei judeu especial. O que os levou a viajar milhares de quilômetros? Afinal, eles não visitaram outros reis judeus. É claro que foi a estrela, mas é preciso ter havido um conhecimento prévio.
“Os astrólogos babilônios não obtiveram seu conhecimento por meio de adivinhação oculta e astrologia, mas por uma revelação de Deus.”
Por um lado, os babilônios tinham algum conhecimento das escrituras hebraicas por meio dos judeus que foram exilados na Babilônia e ali viviam. Um desses judeus foi também o sábio Daniel (Dn 1.19-20; 5.11-12). O livro de Daniel foi escrito na Babilônia. Nele, Daniel indicara profeticamente o momento exato da vinda do Messias com base nas 70 semanas-anos em Daniel 9.24-17. É bem possível que, na qualidade de principal de todos os sábios em Babel (Dn 2.48), Daniel tivesse muitos contatos e diálogos com os outros sábios, podendo convencê-los da vinda de um futuro Messias judeu. Por outro lado, o feiticeiro Balaão já havia anunciado nos tempos de Moisés a vinda do Messias em conexão com sua estrela: “Eu o vejo, porém não agora; eu o contemplo, mas não de perto. Uma estrela procederá de Jacó, de Israel subirá um cetro...” (Nm 24.17). O cetro sempre foi um símbolo da soberania real. Daniel conhecia as escrituras do Antigo Testamento existentes na sua época e as estudava (Dn 9.2). Certamente, ele também passou adiante o que sabia. É interessante que Balaão era natural da localidade de Petor (Nm 22.5), uma cidade às margens do rio Eufrates, na Babilônia.
É provável que esse conhecimento tenha passado de geração em geração. Sendo assim, os astrólogos babilônios não obtiveram seu conhecimento por meio de adivinhação oculta e astrologia, mas por uma revelação de Deus.
Os três presentes que os magos entregaram ao menino Jesus eram ouro, incenso e mirra. Estes são portadores de um profundo simbolismo veterotestamentário: o ouro aponta para a realeza, o incenso é símbolo de adoração e divindade. Para o tabernáculo e, mais tarde para o templo, empregou-se muito ouro, e o incenso era utilizado para a adoração. Já a mirra era usada para embalsamar os defuntos. O significado dos presentes consiste em que Jesus era o rei de Israel (ouro); sua vida foi uma vida divina que adorava e glorificava Deus Pai (incenso); e, finalmente, ele morreu como Cordeiro de Deus, para depois ressuscitar (mirra).
Graças a esses presentes, Maria e José tiveram recursos para depois financiar a dispendiosa fuga para o Egito e a permanência ali – é maravilhoso como o Deus do céu provê o sustento dos seus.
Quando os magos do Oriente entraram na casa em Belém, viram primeiro Jesus e só depois Maria, a mãe, e adoraram o menino, não a mãe: “Entrando na casa, viram o menino com Maria, sua mãe. Prostrando-se, o adoraram...” (Mt 2.11). Isso contrasta com muitas representações artísticas, nas quais Maria é posta em evidência.
O massacre das crianças em Belém e a fuga para o Egito
A maioria dos israelitas esperava que seu Messias fosse um poderoso líder militar, talvez como Alexandre, o Grande, que os libertaria do domínio estrangeiro romano e de Herodes. Eles esperavam que o seu salvador viesse logo (Lc 2.25,38; 3.15). E agora aparecem esses magos de longe para reverenciar o rei recém-nascido. Herodes viu nisso uma ameaça ao seu poder e assim, esse soberano, inescrupuloso desde sempre, não vacilou em mandar matar todos os bebês de Belém e arredores (Mt 2.16).
O Egito não era necessariamente incomum como destino da fuga de José e Maria. Muitos judeus emigravam para o Egito porque, naquela época, já havia lá grandes colônias de judeus, remanescentes da fuga dos judeus diante dos babilônios (Jr 43-44).
O anjo Gabriel
Gabriel é um anjo “a serviço de Deus” (Lc 1.19) e que transmitia mensagens especiais de Deus em ocasiões extraordinárias. A propósito, ele nunca é chamado de arcanjo – na Bíblia, esse título é exclusivo de Miguel (Jd 9). Quinhentos anos antes do nascimento de Jesus, Gabriel transmitiu duas vezes uma revelação especial de Deus ao profeta Daniel (Dn 8.15-17; 9.21). Depois de séculos de silêncio, ele apareceu ao sacerdote Zacarias para lhe anunciar o nascimento de João Batista (Lc 1.19), e mais tarde anunciou a Maria o nascimento de Jesus (Lc 1.26). É possível que também tenha sido o anjo Gabriel quem apareceu a José em sonho, mas isso não consta das Escrituras (Mt 1.20). Da mesma forma, a Bíblia não explicita quem foi o anjo de trouxe as boas novas aos pastores nos campos de Belém (Lc 2.9).
Maria e Isabel
Quando a recém-grávida Maria visitou na região montanhosa da Judeia sua parente Isabel, que já se encontrava no sexto mês de gravidez (Lc 1.36), o bebê saltou de alegria no ventre de Isabel. Tudo indica que Isabel sabia do estado de Maria e cria que o filho dela seria o Messias. Por isso ela, cheia do Espírito Santo, saudou Maria chamando-a de “mãe do meu Senhor” (Lc 1.43). Em vez de ficar ciumenta e reagir com inveja, ela se alegrou com Maria e louvou a Deus.
O subsequente cântico de louvor de Maria em Lucas 1.46-55 é conhecido na tradução latina como “Magnificat”, e lembra muito o cântico de Ana por ocasião do nascimento de Samuel, em 1Samuel 2.1-10. O cântico de Maria está cheio de referências ao Antigo Testamento e mostra o quanto ela se ocupava com a Palavra de Deus – e o fato de chamar Deus de seu Salvador em seu louvor mostra como ela tinha consciência de necessitar de um salvador.
O recenseamento
O recenseamento que o imperador Augusto ordenou para fins tributários “quando Quirino era governador da Síria” (Lc 2.1-2), está documentado por um antigo escrito latino intitulado “Titulus Venetus”. Este confirma ter sido realizado tal recenseamento na Síria e na Judeia. Os recenseamentos foram típicos para o governo do imperador Augusto. Além disso, considera-se fato histórico que os recenseamentos tenham sido prática usual no Império Romano. Esse “constrangimento oficial” obrigou José a ir com Maria de Nazaré para Belém, cumprindo assim a profecia de Miqueias 5.2.
“O nascimento de Jesus como Salvador do mundo deveria dar-se em condições de extrema pobreza. Por isso, ele conhece os mais profundos abismos da humanidade e pode oferecer ajuda a todos.”
Quando, depois de uma cansativa viagem de aproximadamente 100 km, eles finalmente chegaram a Belém, com Maria em gravidez adiantada, não encontraram hospedaria. A obediência não presume necessariamente uma vida confortável se a vontade de Deus previr algo diferente. O nascimento de Jesus como Salvador do mundo deveria dar-se em condições de extrema pobreza. Por isso, ele conhece os mais profundos abismos da humanidade e pode oferecer ajuda a todos. Jean Koechlin explica a respeito: “A todo lugar aonde o pecado nos levou, o amor e a obediência do Senhor Jesus o conduziu para nos redimir.”
Os pastores
Os pastores foram os primeiros a receber a mensagem sobre o recém-nascido rei dos judeus. Ao que parece, Jesus nasceu em um estábulo ou uma gruta bem perto deles. Os pastores pertenciam à camada mais baixa da sociedade daquele tempo e cuidavam dos cordeiros destinados ao sacrifício no templo. Certamente terá sido também por isso que os pastores haveriam de ser os primeiros a ouvirem do nascimento do Cordeiro de Deus e a saudá-lo.
O sinal para os pastores consistiria em encontrarem o Rei dos judeus deitado numa manjedoura. Isso, é claro, era incomum. O Cordeiro de Deus repousaria numa manjedoura da qual os cordeiros obtinham seu alimento – ele se tornaria o alimento para a vida.
No Antigo Testamento, já se anunciara que Deus mesmo daria um sinal pelo fato de o Senhor Jesus nascer de uma virgem: “Portanto, o Senhor mesmo lhes dará um sinal: eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho e lhe chamará Emanuel” (Is 7.14).
A apresentação de Jesus no templo
Com base em Lucas 2.21-24 pode-se deduzir a idade de Jesus quando ele foi apresentado no templo. Depois do nascimento de um menino, a mãe era considerada impura por sete dias. No oitavo dia, o menino deveria então ser circuncidado. O oitavo dia é considerado o mais seguro para a coagulação do sangue. Além disso, depois do nascimento de um menino, a mulher tinha de permanecer mais 33 dias em casa. Depois disso, a mãe e a criança deveriam apresentar ao sacerdote, à entrada do tabernáculo (posteriormente, do templo), a oferta de um cordeiro de um ano ou uma pombinha ou uma rolinha, dependendo da situação econômica da família (Lv 12.1-8). Portanto, Jesus foi apresentado no templo com a idade de 41 dias (8 + 33 dias). O fato de José e Maria oferecerem pombas revela que eram pobres. Naquela ocasião, a visita dos magos ainda não tinha ocorrido.
“No mínimo cinco profecias veterotestamentárias sobre a vinda do Messias cumpriram-se literalmente em torno do nascimento de Jesus.”
Quando o idoso Simeão tomou o bebê nos braços, ele enunciou duas profecias:
- Jesus seria uma luz para iluminar as nações e glorificar Israel (Lc 2.32).
- Jesus causaria a ruína e a elevação de muitos em Israel (v. 34).
Essas duas previsões tratam respectivamente tanto da primeira vinda de Jesus, como também do seu retorno ainda futuro:
- Como Israel o rejeitou, Jesus tornou-se primeiro uma luz para as nações (a igreja). Quando retornar em glória, ele salvará e glorificará Israel.
- Com a rejeição de Jesus, a maior parte do povo judeu caiu em 70 d.C. com a destruição de Jerusalém e sua dispersão. Quando retornar, Jesus elevará o Israel que teve de passar pela tribulação.
Contradições?
Lucas 2.39 relata que, depois da apresentação no templo, José e Maria retornaram com o menino Jesus para Nazaré. Aqui surge a questão do enquadramento do período no Egito. Será que a família morava em Nazaré, foi de lá para Jerusalém para em seguida retornar a Nazaré? Lucas não menciona nem os magos do Oriente nem a fuga para o Egito. A omissão desses eventos não precisa significar que não tenham ocorrido. A questão pode ser explicada no sentido de que o evangelista Lucas achou desnecessário mencionar em seu relato um evento importante para os judeus, mas irrelevante para os gentios. Provavelmente, a sequência foi:
- Jesus nasceu em uma estrebaria em Belém.
- Os pastores visitaram o recém-nascido.
- Jesus foi circuncidado e recebeu seu nome.
- Os pais foram com Jesus para Jerusalém a fim de apresentar o Salvador no templo.
- Retornaram a Belém e passaram a morar numa casa ali.
- Vieram os magos da Babilônia.
- Depois disso ocorreu a fuga para o Egito.
- Após o retorno do Egito, a família se mudou para Nazaré, a cidade de José e Maria.
Os seguintes eventos são relatados apenas por Mateus:
- O sonho de José
- A visita dos magos
- O massacre das crianças em Belém por Herodes
- A fuga para o Egito
- O retorno do Egito
Os seguintes eventos são relatados apenas por Lucas:
- O anúncio do nascimento de Jesus
- A visita de Maria a Isabel
- O cântico de Maria
- Os pastores de Belém
- A circuncisão de Jesus
- A apresentação de Jesus no templo
Profecias cumpridas
No mínimo cinco profecias veterotestamentárias sobre a vinda do Messias cumpriram-se literalmente em torno do nascimento de Jesus:
- O nascimento virginal (Mt 1.23) cumpriu Isaías 7.14.
- O nascimento em Belém (Mt 2.6) cumpriu Miqueias 5.2.
- A fuga para o Egito e o retorno de lá (Mt 2.15) cumpriu Oseias 11.1 e Números 24.8.
- O lamento sobre a morte das crianças em Belém (Mt 2.17) cumpriu Jeremias 31.15.
- O Senhor ser chamado de “Nazareno” (Mt 2.23) cumpriu Isaías 11.1.
A primeira infância de Jesus termina com a frase: “O menino crescia e se fortalecia, enchendo-se de sabedoria; e a graça de Deus estava sobre ele” (Lc 2.40).