Você consegue perdoar?

Só poderemos ficar inteiramente livres e curados se concedermos perdão. Um breve relato poderá explicar os efeitos resultantes disso.

Muitos são os que se sobrecarregaram de culpa que os acusa e lhes rouba a tranquilidade. Tornaram-se culpados em relação a outros ou sofreram injustiças da parte de outras pessoas. Com o tempo, essa culpa aprisiona. É uma prisão que nos amarra e isola, podendo mesmo chegar a ser uma prisão de fúria e ódio. Faça então o que Jesus fez: perdoe! Se você mesmo foi perdoado, se for um filho de Deus, se Jesus perdoou os seus pecados, então perdoe você também! Abra a sua prisão e dê o passo do perdão. Talvez aos seus pais, a alguma pessoa próxima ou ao cônjuge. Note-se que não se trata de um ato sentimental, mas antes de obediência ao mandamento de Jesus: “Perdoa as nossas dívidas, assim como perdoamos aos nossos devedores” (Mt 6.12).

“Mitsuo Fuchida comandou o ataque da força aérea japonesa a Pearl Harbor. Piloto destemido e destacado que era, foi selecionado especialmente para essa missão. Também foi ele que deu a famosa ordem aos 360 aviões de combate em espera: ‘Tora! Tora! Tora!’ Ele chamou a matança de 2 300 soldados da marinha norte-americana como ‘o ato heroico mais excitante da minha carreira’.

“No entanto, a maioria das pessoas não sabe que, em 1949, ou seja, pouco menos de oito anos após o ataque a Pearl Harbor, esse homem arrojado encontrou a fé em Jesus Cristo. A fim de levar a essa ‘improvável’ virada, Deus permitiu duas espantosas ocorrências. A primeira delas se deu pouco depois da guerra.

“Fuchida conversava com um conhecido. Ele fazia parte dos japoneses presos e internados nos EUA. Interessava-lhe principalmente o modo como os norte-americanos tratavam os prisioneiros. Por isso ele prestou bastante atenção quando um amigo lhe contou como uma voluntária de 18 anos havia dado particular atenção aos japoneses. Quando os prisioneiros lhe perguntaram por que ela tinha tanta disposição em ajudá-los, a resposta que receberam foi inesperada e inimitável: “Porque soldados norte-americanos mataram meus pais”. Os pais da moça haviam ido ao Japão como missionários quando ocorreu a escalação das tensões internacionais que acabaram por levar à Segunda Guerra Mundial. Depois de o casal missionário ter fugido para as Filipinas, ambos foram condenados por espionagem e decapitados. Sua filha ficou sabendo disso só três anos depois, após ser evacuada para os EUA. É claro que ela reagiu com amarga dor e fúria a essa notícia. Como, porém, ela conhecia seus pais, ela finalmente chegou à conclusão de que eles teriam perdoado os seus assassinos. Ela simplesmente sabia aquilo, e por isso também teve de exercer o perdão. No entanto, não ficaria por isso. Ela queria retribuir o mal com o bem – e por isso ela estava lá nos acampamentos para amar seus inimigos.

“Fuchida ficou extremamente espantado com tal comportamento. Como é que alguém podia reagir de tal modo ao assassinato dos próprios pais? Mais tarde, alguns anos depois, alguém lhe entregou um folheto enquanto esperava pelo trem numa estação. Normalmente ele simplesmente teria descartado tal papel, mas ele viu que o autor também havia sido piloto de combate e aquilo despertou seu interesse.

“Sob o título ‘Fui prisioneiro de guerra no Japão’, o sargento Jacob DeShazer contava como durante um ataque-surpresa da força aérea norte-americana a Tóquio, em represália ao ataque a Pearl Harbor, ele teve de saltar de paraquedas do seu avião. DeShazer foi imediatamente preso pelo exército japonês. Ele descreveu os três anos subsequentes como um pesadelo sem fim de tortura, fome e muitas execuções que custaram a vida dos seus companheiros presos. Detido na solitária, seu mundo encolheu para alguns poucos metros quadrados, mas seu ódio se acendeu e aumentou cada vez mais.

Muito mais do que para o nosso próprio bem, o perdão serve para a glória de Jesus.

“Todavia, depois de dois anos de prisão, entregaram-lhe alguns livros que ele podia ler na meia-luz da sua cela. Entre eles havia uma Bíblia. Como uma luz nas trevas, a Palavra de Deus atingiu seu coração; principalmente aqueles versículos que pareciam dirigir-se diretamente à sua situação: ‘Amem os seus inimigos’. A graça de Deus fez dele um novo homem. Assim, DeShazer começou propositadamente a dirigir-se de forma respeitosa aos carcereiros mesmo quando eles o tratavam de modo grosseiro e humilhante. ‘Pedi a Deus que perdoasse os meus torturadores’, escreveu ele no folheto, ‘e eu estava firmemente decidido a levar a mensagem da salvação àqueles homens com a ajuda de Jesus.’ Fuchida leu a história de DeShazer com grande espanto. Logo depois tratou de comprar uma Bíblia, pois queria cerificar-se pessoalmente de onde vinha esse estranho mandamento de amar seus inimigos. Finalmente, Fuchida encontrou a fé em Jesus Cristo. Ele se tornou evangelista e acabou até colaborando com DeShazer. Ambos pregavam em grandes eventos no Japão e no restante da Ásia. Tornaram-se bons amigos e juntos levaram muitas pessoas à salvação em Jesus Cristo. Tudo isso aconteceu porque duas pessoas não se detiveram apenas no perdão, mas foram muito além; porque duas pessoas retribuíram o sofrimento com amor.”[1]

Sim, perdoemos assim como recebemos o perdão! Será para o nosso próprio bem e, muito além disso, para a glória de Jesus que, ao pender da cruz, disse: “Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que estão fazendo” (Lc 23.34).

Nota

  1. Nancy Leigh DeMoss, Das Tor zur Freiheit (Dillenburg: Christliche Verlagsgesellschaft, 2014), p. 196.

Samuel Rindlisbacher é ancião da igreja da Chamada na Suíça e foi fundamental no desenvolvimento do grande ministério de jovens dela.

sumário Revista Chamada Abril 2021

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