João Batista e a Alegria Expectante

João Batista tinha uma esperança de que a sua recompensa estava garantida nas mãos de Jesus, o seu Senhor. Ele não precisava da afirmação dos demais.

Além da história de seu nascimento, João Batista somente tem sua vida relatada nas Escrituras a partir do momento em que inicia seu ministério. João, como escreve Marcos, simplesmente “apareceu no deserto, pregando” (1.4). E é a partir desse momento que começamos a ouvir sobre ele.

No relato bíblico do encontro de João com o Messias, diferentemente de outros encontros com o Jesus encarnado, a Bíblia não descreve as misérias da sua vida que precisavam da intervenção divina, mas sim as suas boas reações diante do Senhor. Seu coração centrado na sua missão, sua vida completamente dedicada ao Senhor, sua humildade, sua esperança transbordante e sua extrema satisfação e alegria no cumprimento desta missão.

Assim, nosso intuito aqui é observar e fazer uma breve análise dessas reações de João Batista na presença do Mestre. Veremos, juntos, o que a Bíblia nos revela acerca das possíveis motivações de seu coração.

O resumo de tudo o que falaremos a partir de agora é que João tinha uma esperança que gerava uma alegria expectante.

A verdade é que João é a primeira pessoa que a Bíblia descreve reagindo a um encontro com o Cristo encarnado. Este episódio ocorre quando ele ainda estava no ventre de sua mãe e Jesus no ventre de Maria. Em Lucas 1.39-56 vemos o relato da visita de Maria à sua prima Isabel, e lemos ali que, quando a mãe de Jesus fez sua saudação, João se agitou de alegria na barriga de Isabel. Agora, a pergunta que podemos fazer – e que guiará nosso breve estudo – é: por que João expressa tamanha alegria?

Está claro que esse agito de alegria foi obra do Espírito agindo na sua vidinha ainda prematura, já que naquele momento ele não tinha nenhuma capacidade cognitiva para entender o que estava acontecendo ao seu redor. Assim, olhando só para essa reação, seria insensato fazer uma profunda análise das razões da sua alegria. No entanto, veremos que essa mesma alegria, e as motivações que a desencadeia, acompanha o profeta durante sua vida.

Maria e Isabel

Contudo, antes de analisarmos outros momentos da sua vida, vamos nos debruçar um pouco mais neste episódio. Podemos entender que a alegria da vida de João é comparável à alegria das duas outras personagens ali presentes: Isabel e Maria. Dessa forma, queremos introduzi-las em nossa história apresentando suas falas descritas no texto, que nos ajudarão a entender o significado daquele momento:

Isabel. “Em alta voz exclamou: ‘Bendita é você entre as mulheres, e bendito é o filho que você dará à luz! Mas por que sou tão agraciada, ao ponto de me visitar a mãe do meu Senhor? Logo que a sua saudação chegou aos meus ouvidos, o bebê que está em meu ventre agitou-se de alegria. Feliz é aquela que creu que se cumprirá aquilo que o Senhor lhe disse!’” (Lc 1.42-45).

Maria. “Então disse Maria: ‘Minha alma engrandece ao Senhor, e o meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador, pois atentou para a humildade da sua serva. De agora em diante, todas as gerações me chamarão bem-aventurada, pois o Poderoso fez grandes coisas em meu favor; santo é o seu nome. A sua misericórdia estende-se aos que o temem, de geração em geração. Ele realizou poderosos feitos com seu braço; dispersou os que são soberbos no mais íntimo do coração. Derrubou governantes dos seus tronos, mas exaltou os humildes. Encheu de coisas boas os famintos, mas despediu de mãos vazias os ricos. Ajudou a seu servo Israel, lembrando-se da sua misericórdia para com Abraão e seus descendentes para sempre, como dissera aos nossos antepassados’” (Lc 1.46-55).

Vocês conseguem perceber a alegria delas? Parece que, de tão imensa, não cabe no peito! Mas por que uma reação tão efusiva da parte dessas duas mulheres? Porque diante dos olhos delas estava se concretizando uma promessa que há muito tempo elas e todo o povo de Israel conheciam e muitos ainda esperavam ansiosamente. A esperança da vinda do Messias, que os libertaria e governaria, movia os seus corações e condicionava então suas atitudes. E, indo um pouco além, condicionava a maneira que viam o seu mundo e as coisas que aconteciam a elas.

Maria e Isabel conseguiram ver a realidade como Deus a vê; assim, exaltaram ao Senhor pela sua misericórdia e nem cogitaram reclamar de suas reais dificuldades.

Vamos nos colocar por um momento no lugar de Maria e Isabel. Elas poderiam estar se queixando sobre a dificuldade que estavam vivendo devido à gravidez, às dúvidas, ao possível preconceito da sociedade, à desconfiança, ao possível risco de morte (no caso de Maria). Isabel também poderia estar dizendo como era difícil conviver tanto tempo com um marido mudo (e provavelmente surdo). Mas definitivamente esta não foi a reação delas.

Glória a Deus pelo coração dessas mulheres! Elas conseguiram ver a realidade como Deus a vê; assim, exaltaram ao Senhor pela sua misericórdia e nem cogitaram reclamar de suas reais dificuldades. Isto porque a sua atenção não estava centrada nelas mesmas, mas no Senhor delas, que estava fazendo algo maravilhoso naquele momento da história. Suas vidas estavam centradas na promessa. Uma promessa que, sabiam elas, nunca falharia, seu cumprimento era certo. O Messias viria! A alegria delas, o que as motivava, era ver essa promessa se cumprir.

João Batista

Voltando para João Batista, sua vida nos ensina que aquilo que está em nosso coração, o que cremos que precisamos para sermos felizes e satisfeitos, ou o que cremos que dará propósito para nossa vida SEMPRE influenciará as nossas atitudes, sejam elas expressas em pensamentos, palavras ou ações.

Vamos ver um exemplo de como isso funcionou na vida de João lendo sobre outro encontro dele com Jesus.

O texto de João 3.22-30 salienta o coração de João, suas motivações, esperanças e alegrias. Os versículos 28-29 são um resumo disso: “Vocês mesmos são testemunhas de que eu disse: Eu não sou o Cristo, mas sou aquele que foi enviado adiante dele. A noiva pertence ao noivo. O amigo que presta serviço ao noivo e que o atende e o ouve enche-se de alegria quando ouve a voz do noivo. Esta é a minha alegria, que agora se completa”.

João estava dizendo aqui que a alegria dele era ver Jesus sendo recebido pelo seu povo. Não todo o povo de Israel, mas aqueles que criam nele. A “noiva” é a linguagem utilizada para designar a igreja de Cristo posteriormente. A alegria de João, sua esperança concretizada, era ver o Messias chegando na terra, conforme prometido, e ouvir sua voz, tal qual era a esperança de sua mãe, Isabel.

“Esta é a minha alegria, que agora se completa”, disse ele. Que sensação maravilhosa ele devia estar sentindo! Ele estava completo, com o sentimento de trabalho cumprido. Afinal, essa era a missão dele.

Como vimos antes, aqui vemos a confirmação de que aquilo que está no nosso coração é o que dirige nossas atitudes. Quais atitudes podemos ver aflorar nas ações de João diante de seu coração motivado por essa esperança?

  • Ele não se importava que Cristo sobressaísse sobre ele. “É necessário que ele cresça e que eu diminua” (Jo 3.30);
  • Ele se alegrava em apontar para Cristo sempre que tinha oportunidade. “É o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo!” (Jo 1.29);
  • Humildade e um profundo entendimento de quem ele era em relação a Deus. Podemos ver isso em outro encontro de João com Jesus. Quando Jesus vai ao seu encontro para ser batizado, João sabia que era pecador, e diz “eu é que preciso ser batizado” (Mt 3.14, NAA). Ele sabia que Jesus era santo e que tinha toda a autoridade sobre ele;
  • Apesar de não entender a ação de Jesus, ele tinha uma posição de humilde submissão, aceitando a vontade e os planos do Senhor. Podemos ver um contraste entre a atitude de João, de aceitar batizar Jesus (mesmo pensando que não era algo lógico), com a atitude de Pedro na ceia, quando este até mesmo repreendeu Jesus, dizendo: “... nunca lavarás os meus pés!”.

João não busca agradar, ser visto ou elogiado por homens. Ele repreendeu Herodes quando este mostrou atitude reprovável e chamou de “raça de víboras” os fariseus e saduceus que vinham a ele para serem batizados com disposição equivocada.

Em passagens paralelas, também podemos ter algumas dicas das verdades que estavam então arraigadas no coração de João e que nortearam essas atitudes descritas acima:

  • Como já vimos, João sabia de sua pecaminosidade e da sua necessidade de arrependimento: “Eu é que preciso ser batizado” (Mt 3.14, NAA);
  • João sabia qual era sua missão: “Eu sou ‘a voz do que clama no deserto: Endireitem o caminho do Senhor’” (Jo 1.23, NAA);
  • Ele sabia que haverá um julgamento, onde as obras de cada um serão julgadas e todos os corações serão expostos (Lc 3.7-9);
  • Sabia que Jesus era o Filho de Deus (Jo 1.34), que já existia na eternidade: “Aquele que vem depois de mim é superior a mim, porque já existia antes de mim” (Jo 1.15b);
  • João sabia que Jesus era sobre todos, principalmente sobre ele. Sabia que não era digno nem de desamarrar os cadarços de sua sandália (Lc 3.16);
  • João sabia que Jesus não tinha pecado e que estava na terra para tirar o pecado. “É o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo!” (Jo 1.29).

João entendeu que Jesus era o protagonista da história, não ele mesmo. Ele tinha uma esperança de que a sua recompensa estava garantida nas mãos de Jesus, o seu Senhor. Ele não precisava da afirmação dos demais. Como vimos, chamava os fariseus e os saduceus de raça de víboras e criticava Herodes pelas suas más atitudes. Ele foi preso e morreu por causa disso, mas que importa? As verdades sobre a vinda do Messias e sua missão pessoal de anteceder e anunciar o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo governavam seu coração e enchiam sua vida de propósito. Ele com certeza falaria como Paulo: “Porque pra mim o viver é Cristo e o morrer é lucro” (Fp 1.21).

As verdades sobre a vinda do Messias e sua missão pessoal de anteceder e anunciar o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo governavam o coração e enchiam a vida de João Batista de propósito.

Deus, em sua Palavra, nos revela que, assim como ocorreu com João Batista, a esperança ou os desejos regulam nossas atitudes. O que cremos sobre Deus e sobre nós mesmos é o que gera as nossas obras. Podemos ver esse princípio em Tiago 4, quando este pergunta: “De onde vêm as guerras e contendas que há entre vocês? Não vem das paixões que guerreiam dentro de vocês?” (v. 1). Jesus mesmo, em Mateus 12.34, afirma que “a boca fala do que está cheio o coração”. É um processo inevitável. Como diz em Mateus 7.17-20, a árvore boa não pode dar frutos maus e a árvore má não pode dar frutos bons. É um processo lógico. Então não podemos honrar a Deus com nossas atitudes se nosso coração está ambicioso por alcançar coisas terrenas na ânsia de preencher os desejos mais íntimos de nossos corações.

Aplicação

Aqui fazemos uma pausa para lhe desafiar à reflexão. Quais são as SUAS esperanças? Talvez possamos mudar um pouco a ênfase da pergunta para entendermos melhor... Pelo que você espera? Quais são as suas expectativas? Quais desejos você tem no coração? Podemos pensar em outros tipos de esperança: casar, ter filhos obedientes e fiéis ao Senhor, entrar em uma universidade, sair da universidade, ter um carro, uma casa, conseguir sustentar a família... Mas e se o que você tanto deseja realmente não se cumprir? E se você nunca casar? E se você ficar desempregado(a), e se seus filhos o(a) envergonharem diante de outras pessoas? Veja, todas essas esperanças são certamente legítimas; no entanto, como reagimos quando estas não se concretizam? Perdemos as estribeiras? Jogamos a toalha e desistimos de tudo? Xingamos e culpamos Deus e o mundo? Nos deprimimos? Nos isolamos, ficamos irritados(as), emburrados(as)? Nossas atitudes revelam qual o grau de valorização que damos a estas esperanças

Deus quer que a sua Palavra seja a fonte das verdades que governam a minha e a sua vida.

Queremos inserir um último fator nesse processo. As afirmações que julgamos ser verdadeiras são as que geram nossas esperanças/expectativas de vida. Neste ponto, a pergunta que você deveria se fazer seria a seguinte: quais são as verdades que tenho crido e que geram minhas esperanças?

Vamos pegar alguns exemplos práticos para deixar o conceito mais claro:

  • Posso muito bem me atirar de uma janela se acredito que posso voar, uma vez que espero não cair no chão. Talvez isso seja radical e irreal demais. Até porque cremos de todo o nosso coração na lei da gravidade. Ou seja, que se eu me atirar de uma janela vou me espatifar na calçada. Tão grande é a nossa crença na gravidade que até temos dificuldade em confiar nos equipamentos de segurança quando fazemos esportes radicais como rapel, bungee jump, saltar de paraquedas etc.
  • Por isso, vamos tomar outro exemplo mais próximo e plausível: se acredito que vou ser satisfeito(a) quando tiver dinheiro, ter muito dinheiro será minha ambição e esperança. Assim, meu trabalho será prioridade; discipular alguém estará fora de cogitação; quando não estiver muito cansado lerei a Bíblia; envolver-me num ministério da minha igreja local será quase impossível, já que me tomará muito do tempo que poderia estar trabalhando para ganhar mais dinheiro.
  • Se acredito que sou alguém superior aos outros, minha esperança é ser reconhecido(a) como tal. Portanto, vou viver escondendo meus erros, buscando meus direitos, passando por cima daqueles que estão no caminho da minha glória.
  • Se creio que não sou ninguém, posso igualmente esperar que outros me afirmem. Vou me isolar, serei perfeccionista. Como não posso errar, serei legalista comigo mesmo(a), enchendo minha vida de regras e leis, e medirei os outros de acordo com essas leis. Terei dificuldade em perdoar os que me machucam. Vou entrar em depressão quando me sentir rejeitado(a) e não for admirado(a).

Como mencionamos antes, a nossa reação dependerá das verdades que governam nosso coração e que revelam as nossas esperanças mais íntimas. Por exemplo, se não me caso, e isso mexe com a minha vida de tal modo que não consigo me alegrar, então, por baixo do desejo legítimo do casamento, provavelmente está governando meu coração a verdade de que eu só terei uma vida feliz se for casado(a).

Deus quer que a sua Palavra seja a fonte das verdades que governam a minha e a sua vida. Jesus diz de si mesmo: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida” (Jo 14.6). Diante disso, queremos listar aqui algumas verdades que devem governar sua vida:

  • Jesus voltará, julgará e vingará todas as injustiças, violências, traições, roubos, assassinatos e corrupções;
  • Deus valoriza de tal maneira a sua vida que entregou a vida de Jesus para lhe proporcionar liberdade e salvação;
  • Deus dará a você recompensas de acordo com as obras que praticar aqui, enquanto estiver neste corpo;
  • Um dia Deus criará novos céus e nova terra, onde não haverá tristeza, nem medo, nem culpa, nem pecado, nem morte, nem sofrimento, nem doença, nem desastres naturais.

Existem logicamente muitas outras verdades que podemos tirar da Palavra de Deus. Todas essas verdades e esperanças são apenas daqueles(as) que um dia depositaram sua fé no Filho de Deus, Jesus Cristo, aquele que morreu e ressuscitou para o perdão dos nossos pecados, e receberam o dom do Espírito.

Sua vida reflete um coração guiado por verdades falsas centradas em desejos egoístas e terrenos, ou é inundada pelas verdades do evangelho e da Palavra de Deus? Esperamos verdadeiramente que você decida pela segunda opção.

Stefan Yuri Wondracek é formado em teologia pelo Instituto Bíblico Palavra da Vida Argentina. Atua nos setores de design gráfico e criação da Chamada no Brasil.

sumário Revista Chamada Maio 2020

Confira