O indispensável ao lidar com a igreja

1ª Carta a Timóteo | Parte 17 | 1Timóteo 5.22-25

Uma interpretação da primeira carta de Paulo a Timóteo, por Norbert Lieth.

22Não se precipite em impor as mãos sobre ninguém e não participe dos pecados dos outros. Conserve-se puro. 23Não continue a beber somente água; tome também um pouco de vinho, por causa do seu estômago e das suas frequentes enfermidades. 24Os pecados de alguns são evidentes, mesmo antes de serem submetidos a julgamento, ao passo que os pecados de outros se manifestam posteriormente. 25Da mesma forma, as boas obras são evidentes, e as que não o são não podem permanecer ocultas.

A exortação de não “impor as mãos” precipitadamente não é uma prevenção contra ações de forças ocultas (no sentido de perigo de “contaminação” espiritual), mas pretende evitar que alguém seja empossado cedo demais em alguma função.

Entre outras coisas, a imposição de mãos é utilizada na posse (ordenação) de um cargo ou função espirituais. Esse gesto servia para a transmissão e o reconhecimento público desse cargo ou função. Aquele ou aqueles que empossam uma pessoa num cargo público se identificam com essa pessoa.

  • Quando os diáconos foram nomeados, no relato de Atos 6.6, consta: “Apresentaram esses homens aos apóstolos, os quais oraram e lhes impuseram as mãos”.
  • Sobre o envio de Barnabé e Saulo, lemos: “Assim, depois de jejuar e orar, impuseram-lhes as mãos e os enviaram” (At 13.3).

Sobre a nomeação de Timóteo no ministério: “Não negligencie o dom que foi dado a você por mensagem profética com imposição de mãos dos presbíteros” (1Tm 4.14).

Desse modo, fica evidente que ninguém deve ser instituído apressadamente numa função de liderança, pois esta requer muita responsabilidade (3.1). Assim, para tais funções, não deve ser escolhida uma pessoa recém-convertida (3.6). É necessário que ela tenha passado por um período suficientemente comprobatório (3.10) e deve atender aos critérios mencionados em 1Timóteo 3.1-13; Tito 1.5-9 e 1Pedro 5.1-4.

“... não participe dos pecados dos outros” (1Tm 5.22). Jamais deverá haver tolerância com o pecado, nem trato liberal, amistoso ou superficial com casos que envolvem pecado (v. 20-21). Quando manifestamos publicamente o reconhecimento a uma pessoa impondo-lhe as mãos, instituindo-a numa função e, assim, nos identificando com ela, do mesmo modo nos tornamos culpados se essa pessoa foi nomeada prematuramente e, posteriormente, demonstra ser um falso mestre ou uma pessoa inapropriada para o desempenho daquelas funções.

“... Conserve-se puro.” Essa frase reforça uma vez mais que todo cuidado é pouco. Os versículos 24-25 de 1Timóteo 5 devem ser considerados inteiramente neste contexto. Por isso não é aconselhável que uma pessoa seja empossada numa função espiritual de responsabilidade sem primeiramente examiná-la devidamente, pois, em alguns casos, os pecados ocultos são detectados somente mais tarde. As boas obras também devem receber análises semelhantes.

Resumindo, o texto nos ensina que pessoas responsáveis são insubstituíveis nas atividades da igreja e, por isso, precisam ser escolhidas com zelo. Por essa razão deve-se estar atento à procura delas, mantendo olhos abertos e, descobrindo-as, colocá-las a serviço do reino (3.1; Tt 1.5). No entanto, há ao mesmo tempo uma certa cautela envolvida, pois a responsabilidade é grande. A escolha não deve acontecer apressadamente, nem seguindo preferências pessoais, mas as diretrizes bíblicas precisam ser aplicadas.

Pessoas responsáveis são insubstituíveis nas atividades da igreja e, por isso, precisam ser escolhidas com zelo. Por essa razão deve-se estar atento à procura delas, mantendo olhos abertos e, descobrindo-as, colocá-las a serviço do reino.

O versículo 23 deve ser considerado como um apêndice, mas que pode ser indiretamente apreciado no contexto: “Não continue a beber somente água; tome também um pouco de vinho, por causa do seu estômago e das suas frequentes enfermidades”. O tema principal do capítulo é o da escolha de presbíteros e o trato com eles, mas também lida com o relacionamento com as viúvas. Não eram temas que Timóteo tratasse com leviandade. Obviamente, ele era uma pessoa sensível e com uma consciência apurada.

Os versículos 24-25 deixam transparecer que Timóteo tinha alguns problemas. Havia pessoas opacas em sua igreja e Timóteo não sabia como deveria reagir a isso. É possível que a decepção com cooperadores (presbíteros) lhe trouxera muitas dúvidas e lhe causara mal-estar. Afinal, Timóteo ainda era jovem (4.12); contudo, sua responsabilidade era grande, e havia também a presença de uma certa parcela de medo e de insegurança. Ele desempenhava suas funções com muita seriedade.

As tensões decorrentes causavam dores de estômago e Paulo tentava acalmá-lo. Provavelmente a abstenção de vinho também envolvia a sua consciência. Ele não desejava chocar-se com ninguém, nem servir de tropeço. Timóteo desejava portar-se de modo digno, como servo de Jesus e colaborador de Paulo, e estava totalmente dedicado à sua tarefa.

Paulo havia escrito a carta aos Romanos cerca de oito anos antes de escrever a Timóteo. Aos romanos, Paulo havia ordenado: “É melhor não comer carne nem beber vinho, nem fazer qualquer outra coisa que leve seu irmão a cair [ou se ofender ou se enfraquecer]” (Rm 14.21). Sabendo da posição de Paulo a esse respeito, Timóteo pretendia observá-la. Do mesmo modo, também os diáconos não deveriam ser consumidores de muito vinho (3.8). O presbítero também não devia ser “apegado ao vinho” (Tt 1.7). Também para as mulheres idosas, cuja função seria servir de exemplo, valia a recomendação de não serem “escravizadas a muito vinho” (Tt 2.3).

No entanto, apesar de todas essas orientações sérias, fica claro que o vinho não estava fundamentalmente proibido, apenas era ordenado o seu uso cuidadoso. Paulo tenta acalmar Timóteo e, assim, nos mostra que, além da oração, há recursos práticos, úteis e que devem ser empregados. Nesse caso, não apenas a oração, mas também o uso de “medicamento”.

Além de aliviar o estômago, o vinho também servia para desinfetar a água e ajudava a contornar situações de diarreia. Àquela época, o vinho tomado nas refeições era diluído com duas porções de água. Obviamente, Timóteo não bebia vinho, mas apenas água. O apóstolo o aconselha a tomar algum vinho, provavelmente diante dos argumentos da medicina já mencionados anteriormente. Desse modo, trata-se de uma recomendação unicamente de ordem médica.

Norbert Lieth é autor e conferencista internacional. Faz parte da liderança da Chamada na Suíça.

sumário Revista Chamada Agosto 2020

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