O Messias cumpriu as promessas territoriais?

Quando Jesus Cristo veio para morrer pelos pecados do mundo, ele cumpriu muitas promessas. Segundo alguns teólogos, todas as promessas a Israel teriam sido cumpridas em sua obra redentora. Seria verdade?

Desde o segundo século depois de Cristo, muitos cristãos têm afirmado que a igreja teria ocupado para sempre o lugar de Israel. Em meados do século II, Justino Mártir, em seu famoso Diálogo com o Judeu Trifão, chamou os redimidos de “verdadeira descendência de Israel” (135.3). Na opinião dele, “vós mesmos concordareis que a descendência de Jacó, de que aqui se fala, é outra, e que não se refere a vosso povo, como se poderia pensar. Com efeito, não se concebe como os descendentes de Jacó deixem entrar os nascidos de Jacó; nem como Deus, de um lado, reprove o povo como indigno da herança e, depois, a prometa aos mesmos, como se os aceitasse” (135.5). Portanto, não mais do que uma geração após o fechamento do cânon do Novo Testamento surgiu a deplorável teologia segundo a qual Israel teria sido para sempre substituído pela igreja.

Por todo o Antigo Testamento, começando em Gênesis, o Senhor promete repetidamente a Abraão, Isaque, Jacó e seus descendentes que a terra de Israel pertence ao povo judeu (cf. Gn 12.1-3,7-9; 13.14-18; 15.1-18; 17.1-27; 22.15-19; 26.2-6,24-25; 27.28-29,38-40; 28.1-4,10-22; 31.3,11-13; 32.22-32; 35.9-15; 48.3-4,10-20; 49.1-28; 50.23-25). Em Deuteronômio afirma-se pelo menos 25 vezes que a terra é um presente de Deus ao povo de Israel (Dt 1.20,25; 2.29; 3.20; 4.40; 5.16 etc.). Walter Kaiser, um estudioso do Antigo Testamento, observa em Toward an Old Testament Theology [Rumo a uma teologia do Antigo Testamento]: “Por 96 vezes, o autor de Deuteronômio repete a promessa de que algum dia Israel ‘possuirá’ e ‘herdará’ a terra que lhe foi prometida” (p. 124-125). Os salmos, manual de Israel para o louvor a Deus, frequentemente conduzem o devoto a agradecer ao Senhor por suas promessas e sua fidelidade pela Aliança. O próprio Senhor declara, por exemplo: “Pois o Senhor escolheu Sião, preferiu-a por sua morada, dizendo: ‘Este é para sempre o lugar do meu repouso; aqui habitarei, pois este é o meu desejo’” (Sl 132.13-14). Os profetas do Antigo Testamento oferecem promessa após promessa sobre a futura restauração da terra (Is 11.1-9; 12.1-3; 27.12-13; 35.1-10; 43.1-8; 60.18-21; 66.20-22; Jr 16.14-16; 30.10-18; 31.31-37; 32.37-40; Ez 11.17-21; 28.25-26; 34.11-16; 37.21-25; 39.25-29; Os 1.10-11; 3.4-5; Jl 3.17-21; Am 9.11-15; Mq 4.4-7; Sf 3.14-20; Zc 8.4-8; 10.11-15). Mesmo assim, apesar dessa abundância de claras declarações no Antigo Testamento, muitos afirmam nos círculos acadêmicos da igreja que, no Novo Testamento, Deus teria deserdado seu povo.

Típico dessa mentalidade entre os acadêmicos dos nossos dias é o erudito britânico N. T. Wright ao afirmar em Jerusalem, Past and Present in the Purpose of God [Jerusalém: Passado e presente no propósito de Deus] que as promessas veterotestamentárias não deveriam ser tomadas ao pé da letra, já que teriam sido cumpridas de forma não literal com a primeira vinda de Jesus e pela constituição do corpo mundial de Cristo. Segundo ele, essas promessas teriam sido, “conforme Paulo afirma” e segundo uma “leitura neotestamentária integral”, todas “cumpridas no Messias (2Co 1.20)”. Wright escreve: “Isto não é mera ‘espiritualização’, mas essas promessas, agora consideradas do ponto de vista da cruz e da ressurreição, foram por um lado restringidas a um ponto e, por outro, ampliadas a fim de incluir toda a ordem da Criação” (p. 73).

Gary Burge, um professor do Wheaton College e eco americano da posição de Wright, afirma o seguinte, após citar Karl Barth: “Assim, o Novo Testamento aplica a Cristo todas as expectativas antes dirigidas a ‘Sinai e Sião, Betel e Jerusalém’. [...] Isso explica por que o Novo Testamento adota para a pessoa de Cristo uma linguagem religiosa anteriormente empregada para a Terra Santa ou o templo. É o novo espaço, o novo cenário em que Deus pode ser encontrado” (Jesus and the Land: The New Testament Challenge to “Holy Land” Theology [Jesus e a terra: o desafio do Novo Testamento à teologia da “Terra Santa”], p. 129-130).

Esses teólogos constroem aqui algo baseado em raciocínios puramente abstratos, sem apoio nenhum nem do Antigo nem do Novo Testamento. O que Cristo realizou em sua primeira vinda é a base sobre a qual Israel herdará suas promessas materiais e não uma base para a rejeição das suas bênçãos futuras! O apóstolo Paulo responde em Romanos 11 a tais elucubrações quando começa enunciando a pergunta retórica: “Então eu pergunto: será que Deus rejeitou o seu povo? De modo nenhum! [...] Deus não rejeitou o seu povo, a quem de antemão conheceu...” (Rm 11-1-2). E enfatiza isso ao repetir: “Então eu pergunto: será que eles tropeçaram para que caíssem? De modo nenhum!...” (Rm 11.11).

Esses teólogos ensinam às pessoas coisas que não se encontram na Bíblia. Onde é que o Novo Testamento ensina que Israel foi deserdado da terra? E por que o Novo Testamento nem menciona isso? Porque nunca aconteceu! Eles constroem tais raciocínios abstratos porque não há nenhuma passagem que ensine que Israel tenha sido deserdado das promessas territoriais.

Se considerarmos essa recondução de alcance mundial e revivificação do povo de Israel de um modo nunca visto antes, seria mais pertinente perguntar: “Por que Deus haveria de levar o povo judeu de volta para a sua terra e revivificá-lo como nação se de qualquer modo ele não tem futuro naquela terra?”.

Deus não rejeitou o seu povo – e não o fará! Maranata!

Thomas Ice é Ph.D. pelo Tyndale Theological Seminary. Autor de aproximadamente 30 livros, também é um renomado conferencista.

sumário Revista Chamada Maio 2022

Confira