Sionismo

O que é? Que relação há com a palavra de Deus? Um cristão deve ser sionista?

Há alguns anos, minha esposa e eu hospedamos em nossa casa alguns estudantes estrangeiros por ocasião do Dia de Ação de Graças. Com isso, eles puderam conhecer essa festa no ambiente de uma família americana. Entre os nossos hóspedes havia também um jovem estudante da Arábia Saudita. Quando ele viu na nossa mesinha de centro uma revista cristã com um artigo de capa sobre Israel, ele nos perguntou se gostávamos de Israel. Respondemos que apreciávamos muito Israel e que há quarenta anos até passamos a nossa lua-de-mel ali.

O estudante saudita disse que apreciava os judeus, mas odiava os sionistas porque estes queriam dominar o mundo. Contei-lhe que somos sionistas cristãos. Como não somos judeus, isso o surpreendeu muito. Ele me perguntou: “O que é um sionista cristão?”. Naquela tarde passei grande parte do meu tempo explicando-lhe o evangelho e o sionismo cristão. Curiosamente, um dos outros estudantes, que ficou principalmente ouvindo a nossa discussão, era um palestino árabe de Ramala em Israel.

Nas últimas poucas décadas ficou claro nas comunidades seculares e religiosas liberais que muitos evangélicos americanos apoiam o moderno estado de Israel. E, vejam só, não se aprecia isso nem um pouco! Enxerga-se nisso um perigo continuamente crescente e até a possibilidade de o sionismo cristão poder desencadear uma terceira guerra mundial. Por alguma razão, Israel não se encaixa na visão que a elite tem da atual ordem mundial. Eles consideram o moderno Estado de Israel uma ameaça.

O que é sionismo?

Theodor Herzl (1860 – 1904), Fundador do sionismo moderno.Theodor Herzl (1860 – 1904), Fundador do sionismo moderno.

“O sionismo é considerado um movimento judeu moderno que tem o objetivo de recolonizar a terra de Israel e de reavivar uma nação judia independente”. É evidente que o termo “sionismo” deriva do nome bíblico “Sião”, que ocorre 163 vezes na Bíblia (156 vezes no Antigo Testamento e 7 vezes no Novo). O salmista utilizava o conceito de Sião durante o exílio babilônico ao se lembrar saudosamente da sua pátria. “Às margens dos rios da Babilônia, nós nos assentávamos e chorávamos, lembrando-nos de Sião” (Sl 137.1). Por isso, não surpreende que “Sião” ou “sionismo” tenha se tornado a expressão judia moderna para o anseio do povo judeu em retornar a Jerusalém e a Erez Israel.

“O termo ‘sionismo’ foi enunciado pela primeira vez publicamente na noite de 23 de janeiro de 1892, por Nathan Birnbaum, durante um colóquio em Viena. A história do sionismo político começa quatro anos depois, com a publicação do ‘Estado judeu’ de Herzl e o primeiro congresso sionista”. O próprio Birnbaum explicou em uma carta de 6 de novembro de 1891 o que ele queria dizer com esse termo: “[A] criação de uma organização do Partido Sionista político nacional, contrariamente ao partido de orientação prática existente até então”. Com “orientação prática”, Birnbaum queria dizer filantrópica ou apolítica. Já havia esforços nesse sentido antes de Theodor Herzl (1860-1904) fundar em 1897 o Movimento Sionista por meio do primeiro congresso sionista mundial em Basileia, na Suíça. Embora inicialmente o sionismo fosse em grande parte secular e político, com o passar dos anos ele também foi incluindo judeus religiosos sionistas. Hoje, o sionismo abrange todos os que, seja por qual motivo, desejam que a nação de Israel continue existindo como Estado judeu e anseiam pelo seu bem-estar.

“Hoje, o sionismo abrange todos os que, seja por qual motivo, desejam que a nação de Israel continue existindo como Estado judeu e anseiam pelo seu bem-estar.”

Sionismo cristão

“O sionismo cristão é a convicção religiosa de alguns cristãos de que o retorno dos judeus à Terra Santa e a reconstituição física de Israel coincidem com a profecia bíblica. Além disso, o sionismo cristão é motivado pela convicção bíblica de que os judeus continuam sendo o povo escolhido de Deus e que têm um direito perpétuo sobre a terra de Israel. Essa convicção baseia-se em uma determinada interpretação da Escritura”. Em geral, os sionistas cristãos creem que o retorno de Israel à sua terra prometida cumpre dúzias de profecias veterotestamentárias. Consideram tudo isso um sinal de que Deus está preparando o cenário para os eventos que ocorrerão no futuro período de tribulação, que durará sete anos. Para que isso possa acontecer, Israel precisa ser novamente uma nação e ter o controle sobre Jerusalém. Isso se tornou fato a partir de 1967.

David Ben-Gurion proclamando a Declaração de Independência de Israel em 1948David Ben-Gurion proclamando a Declaração de Independência de Israel em 1948.

O estudioso inglês Paul Wilkinson diz: “Sionismo cristão é um conceito genérico sob o qual muitos cristãos que apoiam Israel se enquadram. [...] Segundo entendo, o sionismo cristão definido corretamente inclui os seguintes elementos essenciais:

  1. Uma clara distinção bíblica entre Israel e a igreja.
  2. O arrebatamento da igreja, que pode acontecer a qualquer momento antes do período da tribulação.
  3. O retorno dos judeus à sua terra.
  4. A reconstrução do templo.
  5. Um período de sete anos conhecido como tribulação.
  6. A salvação nacional dos judeus.
  7. O retorno de Cristo a Jerusalém.
  8. O reinado milenar de Cristo na terra”.

Wilkinson descreve o que se tornou o sionismo cristão americano.

No passado, o sionismo cristão era conhecido como “restauracionismo”, que teve início no fim do século XVI entre protestantes ingleses. Partindo da Inglaterra, o restauracionismo espalhou-se por todo o protestantismo europeu, mas no mundo de fala inglesa ele foi mais forte. Onde quer que se fizesse presente a Bíblia inglesa, havia pessoas que podiam ler a Escritura por conta própria e que encontravam passagens que ensinavam o restabelecimento dos judeus na sua pátria Israel. “Desde a Reforma, houve anglicanos e protestantes interessados no restabelecimento dos judeus em sua terra. Entre os primeiros apoiadores ingleses desse restabelecimento contam-se os teólogos Henry Finch e Thomas Brightman, do século XVII”.

Martin Luther King Jr. (1929-1968) foi um notável defensor cristão de Israel e do sionismo.Martin Luther King Jr. (1929-1968) foi um notável defensor cristão de Israel e do sionismo.

No mundo de fala inglesa, o cristianismo americano foi o elemento mais amigável a Israel, desde a América colonial até os nossos dias. O motivo disso pode ser o fato de a América não ter sido fundada primariamente por cristãos comuns, mas por cristãos protestantes, que tinham afinidade pelos semitas – os puritanos. Por isso não existiu na América o secular antissemitismo que predominou durante a Idade Média na Europa como parte de sua herança cultural. Yaakov Ariel observa: “Entre as primeiras gerações de colonizadores ingleses, convicções messiânicas pré-milenaristas eram populares nos Estados Unidos recém-formado [...] suas esperanças messiânicas incluíam a conversão dos judeus ao cristianismo e a reconstituição do povo na Palestina”. Além disso, o sionismo cristão americano baseia-se predominantemente no dispensacionalismo, que representa a mais forte e decidida forma de expressão do sionismo cristão. “A expressão dispensacionalista do sionismo cristão é a que predomina na América”, observa Richard Kyle.

A influência do sionismo cristão

Em Gênesis 12.3 encontramos a promessa de Deus de que ele abençoaria aqueles que abençoassem Abraão e seus descendentes (ou seja, Israel). A aliança abraâmica dirige-se a Abraão, Isaque, Jacó e seus descendentes. Em Gênesis, ela se dirige a eles vinte vezes (12.1-3,7-9; 13.14-18; 15.1-18; 17.1-27; 22.15-19; 26.2-6,24-25; 27.28-29,38-40; 28.1-4,10-22; 31.3,11-13; 32.23-33; 35.9-15; 48.3-4,10-20; 49.1-28; 50.23-25). Embora a aliança abraâmica tenha muitas marcas características, ela sempre contém a promessa da terra para Israel. Estaria ainda válida essa promessa ou teria entrementes sido cancelada? Como Deus quer que tomemos essas promessas ao pé de letra, e como continuam dirigidas a Israel e não à igreja, não deveria ser surpresa para ninguém que tal visão leve em certa medida a um sionismo cristão. Para quem não crê num futuro para um Israel redimido na terra de Israel, fica difícil entender como ter uma compreensão correta da Palavra de Deus, já que todo o plano de Deus para a história gira em torno dessa questão. Na minha opinião, a Bíblia deixa isso claro.

“Para quem não crê num futuro para um Israel redimido na terra de Israel, fica difícil entender como ter uma compreensão correta da Palavra de Deus.”

Um importante aspecto do sionismo cristão é não apenas o fato de existirem profecias bíblicas sobre o futuro de Israel, mas que Deus prometeu desde o início, em Gênesis 12.3: “Abençoarei aqueles que o abençoarem e amaldiçoarei aquele que o amaldiçoar. Em você serão benditas todas as famílias da terra”. Esse modelo aparece em todo o restante de Gênesis e da Escritura. Observando-se bem Gênesis 12.3, fica claro que essa passagem constitui a base para o sionismo cristão.

“Abençoarei aqueles que o abençoarem e amaldiçoarei aquele que o amaldiçoar. Em você serão benditas todas as famílias da terra”.“Abençoarei aqueles que o abençoarem e amaldiçoarei aquele que o amaldiçoar. Em você serão benditas todas as famílias da terra”.

“Abençoarei” é um compromisso que expressa o que Deus fará, por ele ser o sujeito. A declaração “aqueles que o abençoarem” está no plural. Em contraste com isso está a declaração de Deus que diz no singular: “... amaldiçoarei [arar] aquele que o amaldiçoar [qalal]”. Isso expressa o desejo que Deus tem de abençoar muita gente. Todavia, a pessoa que amaldiçoar Abraão e seu descendente será amaldiçoada por Deus. No texto original hebraico, a segunda palavra traduzida como “amaldiçoar” significa “tratar negligentemente”, enquanto a primeira é uma forte expressão de maldição. Allen Ross explica:

Os dois termos para “amaldiçoar” – “arar” e “qalal” – são sinônimos e assim seu significado se sobrepõe. Mas “arar”, a mais forte das duas, significa impor um obstáculo ou proibição, impedir o movimento ou outras habilidades, ou então afastar do lugar e do poder da bênção. “Qalal” (“tratar negligentemente”) significa desprezar, falar ou amaldiçoar de modo leviano. Portanto, todo aquele que tratar Abrão e sua fé de forma desrespeitosa e leviana será afastado do lugar da bênção. A seleção dos termos implica essa ameaça como parte necessária do cumprimento das promessas.

Em essência, Deus comunica a Abrão que ele abençoará a ele e a seus descendentes (Israel) para em seguida abençoar o mundo todo por intermédio deles – em última análise, por meio do Messias Jesus, que descende de Abraão. Embora Jesus seja o cumprimento principal, essa aliança contém ainda muitos outros temas subalternos. O mundo também será amaldiçoado se tratar de forma leviana Abrão e seus descendentes (Israel), tentando ignorar o seu Deus.

“A aliança abraâmica é o centro da teologia cristã sionista com os aspectos proféticos que sustentam essa convicção.”

A aliança abraâmica é o centro da teologia cristã sionista com os aspectos proféticos que sustentam essa convicção. “Os sionistas cristãos recorrem à aliança abraâmica para fundamentar o direito de Israel à terra. Eles argumentam que as promessas de Deus a Abraão são ‘concretas e inequívocas’”, diz Wilkinson, “seladas por uma aliança incondicional e eterna (Gn 12.1-7; 15.18-21; 17.6-8; 26.3; 28.13-15; Hb 6.13-17)”. Wilkinson prossegue dizendo: “Os sionistas cristãos insistem em que, ao contrário da aliança sinaítica, ‘vinculada a condições’, essa aliança incondicional não foi cancelada ou substituída pelo Novo Testamento”. Se as promessas abraâmicas tiverem sido sucedidas ou substituídas de algum modo pelo Novo Testamento, onde se encontram então as passagens bíblicas que ensinam isso? Pelo contrário, Romanos 9–11 diz que, se atualmente Israel não crê, isso deixará de existir em determinada ocasião e Deus cumprirá todas as bênçãos prometidas a Israel e abençoará o mundo inteiro por meio de Israel. Isso resultará no cumprimento definitivo das promessas abraâmicas. O Novo Testamento mostra como a profecia veterotestamentária avança e é cumprida, e, antes disso, revela o mistério antes oculto no plano de Deus com a história, conhecido como igreja. A fase seguinte do seu plano trata da incredulidade transitória de Israel, que levará à sua conversão nacional.

Thomas Ice é Ph.D. pelo Tyndale Theological Seminary. Autor de aproximadamente 30 livros, também é um renomado conferencista.

sumário Revista Chamada Janeiro 2022

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