Israel e a saída do Egito

Uma opinião cada vez mais aceita sobre a saída de Israel do Egito é a de que o monte Sinai bíblico nem se localizava na península do Sinai, mas na outra margem do mar Vermelho, na atual Arábia Saudita. Essa tese, porém, torna-se difícil de defender porque o nome Sinai está vinculado a um território gigantesco e com claros limites geográficos – e os nomes de regiões tão claramente delimitados e grandes geralmente não mudam ao longo da história. Historicamente também não há registro de nenhum outro nome para a península, mesmo no Antigo Egito, cuja historiografia composta de inscrições em templos e túmulos é provavelmente a mais antiga do mundo. Por isso é nada mais do que lógico que o monte Sinai se encontre na península de mesmo nome.

São frequentes as especulações em torno do local em que os israelitas atravessaram o mar, qual foi sua trajetória através do deserto e onde se localizava o monte de Deus.

Ainda assim, mesmo entre os cristãos, cada vez mais pessoas supõem que o monte Sinai se localize na Arábia Saudita. Essa opinião baseia-se num comentário do apóstolo Paulo na carta aos Gálatas: “Porque Agar é o monte Sinai na Arábia...” (Gl 4.25, BKJ). Essa declaração, porém, permite várias interpretações. Tanto pode ser que o monte realmente se encontre na Arábia, como que na Arábia o monte Sinai se chame “Hagar”.

A versão acima aponta para a segunda alternativa. Ao que parece, é o significado mais plausível dessa passagem, já que na mesma carta Paulo relata ter passado três anos na Arábia (Gl 1.17-18). Com isso ele provavelmente se refere ao Reino Nabateu, que compreende aproximadamente a área da atual Jordânia. Assim, Paulo conheceria a linguagem popular árabe. Além disso, deveríamos levar em conta quanto a isso que também no hebraico o monte Sinai tem ainda outro nome, a saber: Horebe.

Além disso, vai na mesma direção a afirmativa islâmica de que Abraão também teria vivido em Meca e Medina e que ele também já teria venerado ou até construído a “Caaba” em Meca (Surata 2.127; 2.125; 3.97).

Isso demonstra a importância decisiva em observar atentamente o que a Bíblia efetivamente diz sobre essas questões, como por exemplo a travessia do mar, a jornada através do deserto até o monte Sinai (o Horebe) e a jornada de 40 anos pelo deserto até a terra prometida de Canaã.

Onde os israelitas atravessaram o mar?

Como já dissemos, hoje essa questão adquiriu grande importância porque é cada vez mais popular a teoria de que Israel teria atravessado o mar Vermelho junto à extremidade sul da península do Sinai, no estreito de Tiran ou junto a Nuweiba, penetrando na atual Arábia Saudita. Se isso for verdade, então o monte Sinai bíblico realmente se encontraria na Arábia Saudita.

Hoje os arqueólogos e outros pesquisadores geralmente consideram o que a Bíblia diz como matéria lendária e não confiável. Admite-se que a questão realmente não é simples, uma vez que em muitas ocasiões os lugares mencionados na Bíblia de fato não são fáceis de localizar. No entanto, observações mais acuradas geralmente acabam revelando que essas indicações são muito precisas.

O Êxodo

Israel saiu do Egito na noite entre os dias 14 e 15 do primeiro mês (Êx 12.18,29). Segundo o calendário bíblico original, o mês da primavera, no qual se encaixa a Páscoa, é o primeiro mês do ciclo anual. O primeiro trecho da jornada dos israelitas foi de Ramessés a Sucote (v. 37).

Era o plano de Deus glorificar-se e revelar-se por meio da divisão do mar e da travessia de todo o povo de Israel através dele.

O segundo trecho conduziu-os depois de Sucote a Etã, no limite do deserto (Êx 13.20). Portanto, tinham acabado de deixar o frutífero nordeste do delta do Nilo, onde se localizava a terra de Gósen, na qual os israelitas habitavam, para agora chegar ao deserto.

O momento em que isso aconteceu é extremamente decisivo e significativo, mas facilmente escapa ao leitor. Deus mesmo instrui Moisés a se desviar do caminho empreendido e a caminhar para o norte, em direção ao mar (Êx 14.1-2).

É claro que agora se impõe perguntar de que mar se fala aqui. Cabe notar que, no contexto da travessia, geralmente se fala apenas do “mar” e não do “mar de juncos”. Nos três capítulos relevantes (13–15) cita-se dezenove vezes o “mar” e apenas duas vezes o “mar de juncos”. Pergunta-se então se o mar de juncos corresponde realmente ao mar Vermelho, como geralmente se supõe, ou se isso descreve apenas um evento particular junto ao mar.

Em um mar de água salina não crescerão juncos. No mar Vermelho, isso só será possível onde houver afluência de água doce de alguma grande planície ou vale, ou ainda, como é quase sempre o caso em áreas desérticas, onde ela avança subterraneamente para o mar passando através de cascalho. Este é o caso no golfo de Aqaba ou em Eilat. É verdade que hoje quase não existe mais junco ali porque a terra passou a ser cultivada e o junco representa um transtorno para isso. É claro que isso também se aplica à outra margem, ao golfo de Suez. O fato de que nas duas extremidades do norte do mar Vermelho se encontrava originalmente apenas junco provavelmente fez com que o mar fosse simplesmente chamado de mar de juncos. De resto não cresce junco nas margens do mar Vermelho, exceto justamente naqueles locais em que a água doce força passagem subterrânea em direção ao mar.

Encontramos as mesmas condições em grau muito maior no delta do Nilo e no litoral norte da península do Sinai, junto ao chamado lago Serbonis ou do lago Bardawil, como é chamado hoje. Essa enorme laguna de água doce está separada do mar Mediterrâneo apenas por uma estreita faixa de terra, com grande ocorrência de junco. Por isso é compreensível que o relato bíblico chame também duas vezes essa região à beira do mar Mediterrâneo de mar de juncos, enquanto de resto se fala predominantemente apenas de “mar”.

O contraditório retorno e o desvio para o norte, em direção ao mar

A localização geográfica das três localidades de Pi-Hairote, Migdol e Baal-Zefom, mencionadas no contexto do desvio ordenado por Deus (Êx 14.2), está relativamente assegurada, uma vez que ainda eram conhecidas nos tempos greco-romanos.

O topônimo Baal-zephon indica sua localização no norte do Egito, uma vez que o termo “zephon” significa norte. Além disso, quando a referência bíblica de Ezequiel 29.10 designa Migdol como local egípcio mais ao norte e Sevene como aquele mais ao sul, assim como comparativamente se fala de Dã e Berseba na terra de Israel, ela comprova que as citadas localidades se encontravam no norte do Egito.

Segundo a instrução de Deus, os israelitas deveriam acampar junto a Pi-Hairote, à beira-mar (Êx 14.2). Para a eventualidade de uma perseguição, o local era ruim, praticamente uma armadilha, porque de lá não havia rota de fuga a não ser pelo mar. Mas foi justamente isso que Deus tinha em mente ao designar aquele local para acampar. Era o plano de Deus glorificar-se e revelar-se por meio da divisão do mar e da travessia de todo o povo de Israel através dele.

Quando os israelitas perceberam a aproximação do exército egípcio, compreensivelmente entraram em grande pânico. O capítulo 14 descreve como Deus salvou milagrosamente o povo de Israel e aniquilou o faraó e seu exército, e termina dizendo: “Israel viu o grande poder do Senhor contra os egípcios, temeu o Senhor e pôs nele a sua confiança, como também em Moisés, seu servo”. Na sequência, no capítulo 15, segue-se então aquele maravilhoso cântico de louvor que os israelitas salvos compuseram e cantaram em gratidão a Deus, o Senhor.

Uma observação precisa do relato bíblico do Êxodo revela que o período entre a saída (que se inicia em Êx 12.29) e a travessia do mar (Êx 14.22) se limita a apenas dois capítulos da Bíblia.

As indicações que a Bíblia fornece também sugerem que a decisão do faraó em recuperar os israelitas (Êx 14.5-9) foi relativamente rápida. Tudo isso indica que, entre a saída e a travessia pelo mar, passaram-se apenas quatro dias e que a viagem de Ramessés até Sucote (12.37) e depois até o mar junto a Pi-Hairote (14.2) representam viagens de um dia cada uma. Também não parece que os israelitas se tenham detido prolongadamente no caminho, uma vez que saíram do Egito com pressa e só queriam tratar de se afastar logo de lá. Conforme então sugerem as informações bíblicas, entre a noite em que abandonaram o Egito (12.29-31) e a noite em que Israel atravessou o mar (14.21-27) haveria apenas três dias inteiros.

Além disso, havia o pedido original que Moisés submeteu ao faraó a mando de Deus para que lhes permitisse uma viagem de três dias pelo deserto para oferecer sacrifícios a Deus (Êx 3.18).

Com isso, as informações bíblicas apresentadas não deixam dúvida que a travessia do mar de modo nenhum poderia ter ocorrido junto à extremidade sul da península do Sinai, nem junto a Nuweiba. A jornada até a extremidade sul do Sinai ou até Nuweiba seria longa demais para o período que a Bíblia sugere. Não existe nenhuma indicação na Bíblia para uma jornada de tal extensão através do deserto em tal período.

A versão da travessia do mar na extremidade sul da península do Sinai ou junto a Nuweiba só pode ser defendida por quem considerar as indicações bíblicas como lendárias ou imprecisas. Isso também deixa claro que o monte Sinai não pode localizar-se na Arábia Saudita.

A segunda parte, na próxima edição, oferecerá respaldo adicional aos dados expostos neste texto.

Fredi Winkler

Fredi Winkler é guia turístico em Israel e dirige, junto com a esposa, o Hotel Beth-Shalom, em Haifa, que é vinculado à missão da Chamada.

sumário Revista Chamada Setembro 2020

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